sexta-feira, 25 de março de 2011

Verter ou não verter?

Numa troca de mensagens sobre as áreas em que me especializo e os tipos de serviço que presto, uma cliente pediu minha opinião sobre o termo "versão". Não sei exatamente o que ela tinha em mente, mas comecei a escrever. Depois de reler minha resposta, a achei até interessante e resolvi adaptá-la e transcrevê-la para cá.

Como termo, versão é apenas uma convenção. Convencionou-se, no Brasil e, se não me engano, apenas no Brasil, chamar a tradução para a língua estrangeira de versão. Poderia ser outro termo. Que tal transmudação? O que não dá é, como se vê muito por aí, tradutores e agências escreverem em seus websites coisas como "we do translations and versions" ou "we provide translation and version services". Um estrangeiro que desconheça as práticas do mercado local deve ficar sem entender.

Estou ciente de que esse é um segmento forte do mercado brasileiro. Na verdade, aqui no Brasil me aparece mais gente me pedindo para verter do que traduzir. Embora eu seja daqueles que acreditam que brasileiro não deveria estar traduzindo para o inglês, não fecho os olhos para o fato de que essa demanda acaba sendo atendida de uma forma ou de outra. Dependendo do serviço e do cliente, até encaro.

Também acredito que não é porque o sujeito é falante nativo de uma língua que ele vai fazer uma boa tradução. Não temos tradutores brasileiros fazendo trabalho porco em português? Também existem americanos cometendo barbaridades ao traduzir para o inglês. No fim das contas, o sujeito precisa ser bom tradutor. Vencida essa etapa é que vamos ver qual é a sua língua nativa.

Quando um brasileiro traduz do português para o inglês, ele tem a vantagem de entender melhor o que está sendo dito no original. Na verdade, há poucos tradutores qualificados no mundo que tenham o português como principal língua de partida. Normalmente, veem-se profissionais que já traduzem do francês ou do espanhol (há muito mais trabalho envolvendo essas línguas, claro) que aproveitam e se metem a traduzir também do português. Essa turma pena um pouco para entender o que se escreve em português e a maneira como as coisas (não) funcionam aqui. Já vi isso muito na minha carreira.

Mas tem o outro lado. Traduzir, no fim das contas, é escrever. Um falante nativo tem mais desenvoltura com a sua língua do que um estrangeiro. Sempre me lembro do Paulo Henriques Brito, tradutor de literatura e poesia que já recebeu até prêmio lá fora por suas traduções para o inglês. Ele diz que traduzir para uma língua estrangeira é difícil porque você não tem muitas saídas. Quando consegue pensar em uma solução para um problema, você se agarra nele e pronto. No português, temos mais jogo de cintura. Às vezes, conseguimos pensar em duas, três, quatro soluções. Podemos nos dar o luxo de escolher esta ou aquela porque é mais eufônica, mais longa ou mais curta.

Feliz era quem lia o que a Editora Globo produzia antigamente, ao combinar o talento de um brasileiro e um estrangeiro para produzir suas traduções. Mas isso se tornou caro demais e, claro, inviável há muito tempo.

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