quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Cada uma que me aparece

A gente descobre cada coisa quando faz tradução. Em um documento que acabei de revisar, apareceram unlawful harassment e take unfair advantage of someone. Se você for literal, tirar vantagem de uma pessoa vai ter sempre uma conotação negativa. Ninguém vai acreditar que você tirou vantagem de outrem, mas o fez direitinho, em condições justas. Talvez aí seja o caso de valer-se da ajuda, dos bons serviços da pessoa. Mas divertido mesmo é o unlawful harassment. O americano é tão pudico, conservador e moralista mas consegue enxergar lá um assédio no ambiente de trabalho e dentro da lei. O que diabo é isso? Um assédio light, uma olhadinha sem compromisso, só de esgueira? Povo estranho, hein?! Depois nós morenos é que somos esquisitos.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

A glimpse of the Brazilian translation market

I just came across the website of a translation agency based in São Paulo. Everything looks nice until you start poking around and reading. The list of services they provide includes “version”, a special kind of service you would be hard-pressed to find anywhere else but in Brazil. In the company’s own words, this “consists in passing a text written in Portuguese to another language.” Their São Paulo address is translated into English (So-and-so Avenue...), and they have a "center of attention" (a call center, I suppose). If that is the best English they can come up with for their website, you can only imagine what goes into the translations they produce.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Cadastro positivo 2

Se você chegou aqui sem ter lido o Cadastro positivo original, logo abaixo, vá lê-lo e depois volte. Senão, a coisa vai ficar meio sem pé nem cabeça.

Numa discussão no Facebook sobre esse assunto, surgiram alguns aspectos importates. A consulta de crédito ao SPC, ao Serasa, já é feita pelas empresas há bastante tempo, como mencionou a colega Val Ivonica. A questão é que essa consulta era feita a um cadastro do qual o seu nome só constava se você era mau pagador. Agora, com o cadastro positivo, a ideia é o contrário: se você é bom pagador, o seu nome vai constar do cadastro como tal. Ocorreu-me também um exemplo prático, que ajuda a entender melhor como a coisa funciona nos EUA.

Se uma pessoa chega aos Estados Unidos e vai morar lá por muito tempo, é orientada a arranjar um cartão de crédito e a começar a, digamos assim, tomar dinheiro emprestado. Vai comprar um carro? Não compre à vista, mesmo que você disponha do dinheiro. Compre a prazo e vá pagando o empréstimo direitinho. Assim, você vai construindo seu histórico de crédito e aumentando um número conhecido como FICO. Quando você for comprar uma casa, uma das coisas que vão olhar é esse número. Se ele for alto, você pode ver a taxa de juros cair 0,5%, até mesmo 1%, dependendo da conjuntura. Se você pensar numa casa de 500 mil dólares e um empréstimo de 30 anos, 0,5% fazem uma bela diferença e você economiza bem mais do que teria economizado se houvesse pagado o carro à vista.

Como eu mencionei, a nossa cultura é bem diferente: corra dos juros e, se puder juntar o dinheiro para fazer a compra mais tarde, à vista, faça-o. É esperar para ver como o cadastro positivo vai se encaixar nessa realidade.

Cadastro positivo

Discute-se atualmente no Brasil o tal cadastro positivo de consumidores. Mas do que se trata? Bom, até hoje, para ter o nome limpo na praça e acesso a crédito, basta pagar suas dívidas em dia. Assim, você evita que o seu nome vá para o SPC, para o Serasa. Ou seja, se o seu nome não aparece na lista, você está tranquilo. Mas o cadastro positivo vem para mudar isso. A ideia, semelhante ao que se vê em países como os Estados Unidos, é que o consumidor deve construir um histórico de crédito, ou seja, fazer dívidas e honrá-las, pagando tudo direitinho. Assim, você mostra que tem capacidade de tomar empréstimos e pagá-los. Mas será que isso dá certo aqui no Brasil?

Eu tenho sérias dúvidas. Se compararmos o Brasil com os Estados Unidos, por exemplo, temos ambientes bem diferentes. Aqui, vocês hão de concordar, comprar a crédito é dureza. A maioria da população compra dessa maneira, mas o faz de mau grado. Quem gosta de pagar até o dobro do preço à vista por um produto? Quem pode e tem um pouquinho de traquejo ainda consegue poupar, investir o dinheiro e comprar à vista, pois o negócio é evitar as taxas de juros escorchantes cobradas no Brasil. Ou seja, toma-se emprestado apenas em último caso. Como é que se constrói um histórico de crédito se não se toma emprestado? E essa história de que um bom histórico de crédito lhe permitirá obter taxas mais baixas dos vendedores não me convence.

Isso tudo me faz pensar em outra diferença entre Estados Unidos e Brasil. Comprar na terra do Tio Sam é muito fácil, uma coisa prazerosa. Compra-se feliz, pois você sabe que está levando um produto de boa qualidade, a um preço razoável e a uma taxa de juros que não te tira o couro. Quando comprei o último carro que tive nos Estados Unidos, paguei 2,99% de juros... ao ano. No ápice da crise, um ex-colega de FMI me apareceu de carro novo. Perguntei-lhe quanto havia pagado de juros. Caí pra trás ao ouvir 0,89% ao ano e quase corri à loja para aproveitar essa pechincha. Aqui, 0,99% ao mês já é um bom negócio. Desse jeito, é aquele sofrimento na hora de entregar o nosso suado dinheiro para o vendedor. O produto não é lá essas coisas, o preço é alto e ainda vamos pagar uma boa grana de juros. Você sai da loja tentando se convencer de que fez um bom negócio. Se a sensação na hora de comprar fosse menos dolorosa, compraríamos ainda mais, o que aumentaria a atividade econômica e traria vários benefícios. Mas, infelizmente, parece que ninguém pensa nisso.

sábado, 4 de dezembro de 2010

Tradução biunívoca? Com certeza!

Tradução cada vez mais é uma correspondência biunívoca. Uma palavra de uma língua não raro acaba sendo traduzida sempre da mesma forma. O tradutor não para pra pensar que aquilo não é idiomático, não é o sentido do texto original ou, simplesmente, é um erro crasso. Hoje me apareceu no Estadão um 'definitivamente' mal empregado no caderno de Esportes. O contexto deixava mais do que claro que o texto em inglês dizia definitely, palavra para a qual o tradutor tinha várias opções em português: sem dúvida, decerto, é claro que… Ele tinha até o 'com certeza', que, por ser usado e abusado, já me parece de gosto duvidoso. No Brasil de hoje, se você faz uma pergunta que provavelmente receberá uma resposta afirmativa, há uma boa chance de o interlocutor mandar de lá um: “Com certeza!” Virou praga.

Mas voltando à tradução biunívoca, os tradutores não percebem que, dessa forma, estão entregando o ouro ao bandido. Ora, se basta trocar uma palavra por outra, o que, grosso modo, equivale a apertar um botão, qualquer um pode fazê-lo. A tradução por máquina se encaixa perfeitamente aí. Abram o olho, tradutores, pois, ao traduzirem mal e, em consequência, denegrirem o nosso ofício, vocês estão cavando a própria cova... e cada vez mais rápido.