quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Terrorismo de verdade

Quando se fala em terrorismo, pensa-se logo no ocorrido no 11 de setembro ou nos episódios recentes em Londres, um dia após o anúncio da cidade como sede das próximas olimpíadas, Madri, onde uma série de explosões no sistema de metrô mataram quase duas centenas de pessoas, e Bombaim, na Índia, onde ataques coordenados a lugares públicos como hotéis e um hospital vitimaram mais de 170. Perto desses episódios, é difícil imaginar que duas pessoas poderiam espalhar o terror e deixar uma região metropolitana inteira de joelhos. Pois foi exatamente isso o que ocorreu em 2002, provando que não é necessário seqüestrar um avião ou lançar mão de explosivos para semear o terror. Bastam dois idiotas com uma idéia errada na cabeça.

Essa história teve provavelmente o seu último capítulo. Foi executado na noite de ontem, com uma injeção letal, John Allen Muhammad, que entrou para a história por ter orquestrado uma série de atentados na região de Washington em outubro de 2002. Num período de três semanas, Muhammad e o então menor Lee Boyd Malvo mataram 10 pessoas e feriram outras três sem nenhuma ligação entre elas e aterrorizaram uma região que ainda se recuperava dos ataques terroristas de 11 de setembro do ano anterior.

Os assassinos escolhiam suas vítimas aleatoriamente e as alvejavam de dentro do porta-malas de um carro. No início, foram sete pessoas no espaço de dois dias, cinco delas no mesmo dia. O medo se espalhou rapidamente, pois os assassinos não se concentraram numa determinada área. Antes, começaram no estado de Maryland e depois seguiram para Virgínia, passando pelo Distrito de Colúmbia, onde mataram um homem. Qualquer um poderia ser uma vítima; bastava estar na rua. Dois episódios ficaram na minha memória.

Naquele ano, morávamos em Crystal City, na cidade de Arlington. Felizmente, o meu trajeto até o trabalho era bastante tranqüilo porque eu não precisava sair à rua. Nosso prédio tinha uma saída que dava para uma galeria subterrânea de lojas e serviços que levava até a estação de metrô. Eram seis estações até a minha. Para minha sorte, o prédio em que trabalhava ficava exatamente sobre a estação de metrô. Uma escada rolante fazia a comunicação entre a estação e a entrada do prédio. Em meio àquele terror, era tudo de que eu precisava.

Mas um dia, tive que ir ao prédio principal do Fundo, a dois quarteirões de onde eu trabalhava. Naquela altura, já havia ocorrido o assassinato no Distrito de Colúmbia. O que havia de comum entre as vítimas era que, no momento em que foram alvejadas, estavam paradas ou andando despreocupadamente. O negócio era não ficar parado para não dar chance ao sujeito. Ao chegar perto do cruzamento da 19th St. com a Pennsylvania, o sinal estava fechado e eu teria que esperar. Não teve outra: fiquei zanzando de um lado para o outro. Se ele tivesse que atirar em mim, eu não seria um alvo fácil.

Num sábado, iríamos a uma festa na casa de uma amiga em Germantown, Maryland, que ficava razoavelmente longe da nossa casa. O problema era que a gasolina do carro não daria para irmos e voltarmos e, ninguém esquecia, uma das vítimas havia sido morta enquanto abastecia o seu táxi. Que dureza! Não podíamos deixar de ir à festa, então não houve saída. Fomos ao posto onde costumávamos abastecer. Vale lembrar que aqui, como na maioria dos estados americanos, não há frentistas nos postos. É o próprio motorista quem abastece. Mas eu não vou me esquecer da cena nunca mais. Uma senhora parou, desceu, enfiou a mangueira de abastecimento no carro e voltou rapidinho pra dentro do veículo, onde ficou toda encolhidinha. Eu, um tantinho mais corajoso, fiquei do lado de fora, mas me vali do mesmo expediente: andei pra lá e pra cá enquanto tentava adivinhar onde o safado poderia estar escondido.

Pode-se dizer que o mais perto que os assassinos estiveram de nós foi quando mataram uma senhora no estacionamento do Home Depot da Arlington Boulevard onde fizemos compras algumas vezes. Assim como em todos os outros casos, era a pessoa errada no lugar errado. Enfim, quando John Muhammad e Lee Malvo foram presos, houve um misto de alívio, claro, e surpresa, pois ninguém imaginava as circunstâncias em que os crimes ocorreram nem que um adulto e um menor podiam ter iludido a polícia por tanto tempo. Com a morte de Muhammad, restou Malvo. Como era menor quando cometeu os crimes — atirou em três pessoas, inclusive na senhora do Home Depot —, não pôde receber a pena capital, mas passará o resto de seus dias na cadeia.

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