domingo, 8 de janeiro de 2023

Dona Jô e o Dinamite

Quando eu era moleque, costumava pôr em ordem de preferência as pessoas de que eu mais gostava.

— Gosto primeiro do “teu pai”, depois do Zico, e depois da minha mãe.

Clarissa sempre ficou na bronca com essa história. Certa vez, me interpelou:

— Coitada da Vovó Jô, papai!

E eu retruquei:

— Ah, minha filha, é que você não viu o Zicão jogar.

Mas havia outro motivo para eu deixar minha mãe em terceiro. Ela gostava do Roberto Dinamite, o craque do Vasco, arquirrival do meu Flamengo. Eu não a perdoava por isso. Ainda bem que ela entendia o fanatismo do filho, pois o marido era tão ou mais fanático.

Tenho que admitir, contudo, que o Roberto era um tremendo jogador. Aquele gol contra o Botafogo, no Maracanã, em que ele amortece o cruzamento no peito, chapela o Osmar e fuzila de voleio o goleiro é demais! O Clássico dos Milhões, sem Roberto de um lado e Zico do outro, nunca mais foi o mesmo.

Pois Bob, se você encontrar a Dona Jô por aí, dá um beijão nela que ela vai ficar feliz. Vão com Deus!

P.S.: Nos tempos de hoje, com processador de texto, P.S. é um abuso, mas não estou nem aí. “Teu pai” era como eu e meu irmão nos referíamos ao meu pai. Por quê? Sei lá! Talvez porque as pessoas se referissem a ele como o “teu pai” e aí, sei lá, ficou. Nós o chamávamos assim e esse costume só foi abandonado, perto de ele morrer, quando eu estava para fazer 10 anos.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2023

Um velório como ela gostaria

Como de costume, eu tinha o texto quase todo na cabeça, mas agora, ao me sentar para escrever, ele me fugiu. Sei nem por onde começar, mas vamos tentar. 

Velórios são sempre eventos tristes, pesados, dos quais participamos porque devemos. Nunca imaginei que me sentiria bem num velório, que, como dissemos ontem, “curtiria” um velório, ainda mais se fosse o da minha mãe. Mas, João Vicente, isso lá é jeito de dar uma notícia dessas? 

Bom, para quem não sabia, minha mãe já não vinha bem há alguns anos. Em 2018, começou a ter umas isquemias e a saúde foi se deteriorando, num processo difícil. Com o passar dos anos, o que era vida virou sobrevida, sobrevivência. Lutou o quanto pôde, mas nos deixou no dia 31, pondo fim a um sofrimento para nós e para ela. Como bem disse um amigo, resolveu ir num dia em que o mundo inteiro estava soltando fogos... e ainda junto com um papa. 

Mas voltando ao velório, eu estava apreensivo. Como seria, já que eu era, digamos, parte interessada? Pois foi especial! Que bom receber amigos, companheiros, parceiros, colegas, que lá estavam para homenagear minha mãe e nos trazer um carinho, um conforto. Que bom ver gente que eu não via há décadas! Foi tudo muito leve, sereno, tranquilo, num ambiente de muita paz. Tristeza? Sim, mas ela não imperou. Ora, afinal, o sofrimento havia acabado. Ficaram e ficarão, isto sim, as muitas lembranças boas. 

No fim, já na hora de correr para pegar o crematório ainda aberto, vimos como aquilo ali foi diferente. Quem passasse na porta, não imaginaria que, pelos presentes, entre eles, vários amigos da “galera do rock”, tratava-se do velório de uma senhorinha de 86 anos, pediatra, mãe e avó. Não se enganem: Dona Jô era do rock e certamente ficou feliz por ver como tudo transcorreu. 

Para encerrar o dia, após nos despedirmos dela no crematório, fomos jantar para celebrar a vida da mamãe. Eu, Eduardo (meu irmão), Mylena (minha cunhada) e um trio muito importante nesses anos: as cuidadoras, Mariana e Isabel, e a fisioterapeuta, Jéssica, que tomaram conta da mamãe com zelo e carinho. Foi um jantar leve, alegre. Pesar? Claro que os momentos de tristeza, de saudade, vêm — escrevi algumas partes deste texto com os olhos marejados —, mas não devemos nos deixar abater. A morte faz parte, deve ser vivida também. Vamos em frente. Um beijo, mãezinha!

quinta-feira, 11 de março de 2021

50

Não, o plano era outro. Hoje, eu estaria em outro lugar, muito provavelmente na Europa, comemorando meus 50 anos. Mas a vida não sai exatamente como a gente planeja.

Há exatamente um ano, a OMS declarava a pandemia do novo coronavírus. Ainda deu tempo de comemorar meu aniversário como costumo fazer: sem muito alarde, com as pessoas mais próximas e mais queridas. Naquele momento, num arroubo de otimismo, como se vê hoje, imaginava que a COVID não atrapalharia meus planos para 2021 e eu faria a tão sonhada viagem. Mas não é motivo para desanimar.

Chego feliz aos 50, sobretudo porque não me sinto com 50 anos, não mesmo. O corpinho, de 49, já não é o de 30, mas a saúde vai bem, obrigado. Exige mais cuidados, mas é assim mesmo. Comer melhor e menos, beber menos, seguir nos exercícios. Não há outro jeito. O coração, bom, está muito bem cuidado. E a cabeça, o mais importante, está melhor do que nunca. Mais tranquila, menos dada a chuvas e trovoadas, embora ainda haja vários pontos a trabalhar.

E o meu dia especial não terá nada de exageradamente especial. Vai ser mais um dia de trabalho, possivelmente muito trabalho. Isso é bom, bom demais. Na atual conjuntura, é uma bênção poder trabalhar. À noite, vou cortar um bolinho com os filhotes  e tomar uma taça de vinho. Uma só, pois a polícia está na rua para evitar aglomerações.

Mas e a viagem? Bom, essa e outras vão ficar para depois. Não sou desses que tem que comemorar exatamente no dia. Eu espero. Os planos estão guardados para quando passar esta ficção científica em que estamos vivendo. Por ora, é celebrar a vida. Viva os 50!

sexta-feira, 27 de março de 2020

Tradução, emoção


Quarentena, confinamento, mas, graças ao bom Deus, tenho trabalhado, ao que sou imensamente grato. Muita gente pelo mundo afora gostaria de estar trabalhando neste momento. Hoje, porém, está mais difícil.

Acabei de escrever (traduzir) algo mais ou menos assim:

O custo humano da tragédia já é assustador e o desafio que as autoridades europeias enfrentam agora para fazer face aos custos sociais e econômicos da crise não encontra precedentes em tempos de paz.

Me deu até um negócio.

Já não sei ao certo quantos textos sobre o coronavírus já traduzi, perto de 10, mas é palpável como eles vêm ficando mais pesados.

Não é fácil traduzir com lágrimas nos olhos. Não é. Não é a primeira vez, mas a segunda. Daquela vez, um projeto sobre violência de gênero, com a narrativa de casos reais, consegui me aguentar. A emoção só transbordou no fim, após o derradeiro ponto final.

Hoje, ainda estou no meio da tradução. O show tem que continuar. Quanto às lágrimas, são de tristeza por tudo isso à nossa volta, pelo porvir, que, decerto será ainda pior. E as lágrimas também são de raiva por termos um boçal, um debochado, um sujeito que não tem o mínimo cacoete de chefe de Estado no comando de uma luta que marcará uma geração inteira. Misericórdia!



quarta-feira, 25 de março de 2020

Quem tem razão?


Ontem foi aniversário da minha mãe. Dona Jô fez 84 anos. Ela me legou muitos ensinamentos, que guardo até hoje e me são úteis. Um dos mais importantes, mas que, na minha teimosia, levei muito tempo para entender e aceitar, foi que você pode até ter razão, mas a perde quando levanta a voz, insulta, agride, briga. Infelizmente, muita gente não percebe isso, como nosso presidente.

Bolsonaro tem razão ao se preocupar com a economia do País em meio a esta gravíssima crise sanitária. A forte desaceleração da atividade vai, sim, causar problemas socioeconômicos sérios — um processo que já começou — e pode até mesmo provocar uma convulsão social, causando mais sofrimento e mais mortes. Contudo, o presidente perde a razão ao, como fez no pronunciamento de ontem, sair da linha mais uma vez e atacar. Não é desse jeito que ele vai conseguir que sua ideia seja abraçada pela população.

Para piorar, Bolsonaro está se isolando cada vez mais. É atrito com o Legislativo e o Judiciário, inimigos desde o começo do mandato. São farpas constantes dirigidas à imprensa, de quem não deveria esperar nada além de críticas, pois imprensa é oposição, como dizia sabiamente o Millôr. É bate-boca com os governadores, que ao tomar decisões próprias mostram que já não veem mais em Bolsonaro um presidente capaz de exercer o comando no enfrentamento da crise. Acima de tudo, é a oposição que o presidente faz ao próprio governo, ao defender uma linha contrária às ações e recomendações de seus ministros, sobretudo o da Saúde. Fico me perguntando por que presidente e ministros não alinham o discurso e as ações antes de ir a público.

Sinto falta de alguém que consiga moderar o comportamento de Bolsonaro. Existe alguém que lê esses pronunciamentos antes da hora e pode aconselhar ao presidente que não carregue tanto nas tintas? Quem ele escuta além do Olavo, de seus filhos, essa gente tão ou mais raivosa do que ele? Quem no governo ou fora dele poderia frear esse ímpeto descontrolado? Isso tudo seria uma aposta política? Se (ou quando) o futuro que Bolsonaro vislumbra se concretizar, com todas as suas consequências negativas, o presidente poderá dizer que ninguém lhe deu ouvido e tomar as medidas que bem entenda. Por ora, porém, os números crescentes de mortos e de casos no Brasil e em várias partes do mundo, combinados com as evidências científicas e as recomendações dos profissionais da área de saúde, tornam essa aposta muito arriscada.

Claro, não podemos perder de vista que a tarefa que Bolsonaro tem pela frente é das mais árduas, ou melhor, a mais árdua: um choque duplo, a tempestade perfeita, uma escolha de Sofia. O cobertor é curto e, por isso, não será possível resolver todos os problemas. Será preciso encontrar um dificílimo equilíbrio entre as medidas para fazer frente à pandemia e as políticas para atenuar a recessão, quiçá, a depressão que vem por aí. Mas não vai ser com desunião que vamos vencer essa guerra.

Uma mudança de tom não vai resolver nossa crise, mas seria extremamente bem-vinda e um bom começo. Aproveitando que a Dona Jô está pertinho, a menos de 10 minutos de carro do Palácio do Planalto, sugiro a Bolsonaro que, se realmente não está contaminado com o coronavírus, do que ninguém tem certeza, vá lá visitar minha mãe e ouvi-la um pouquinho. Ela teria uns bons conselhos para ele. Até hoje, as palavras me ecoam na cabeça: “Não é o que você fala, mas a maneira como você fala.” Sábia Dona Jô!




quarta-feira, 11 de março de 2020

Quarenta e nove


Depois de um dia cansativo, em que resolvi coisas que pai tem que resolver na rua, traduzi um tanto sobre o coronavírus e seus efeitos sobre a economia mundial e continuei a revisar um artigo científico, onde eu acharia ânimo e inspiração para escrever? Escrever? Sim, neste 2020, uma das minhas pretensões era tornar a escrever. Pois ontem resolvi que escreveria alguma coisa pela passagem deste 11 de março. Data melhor não haveria. Ora, completo 49 anos de vida e fecho a última volta dos 40. Um bom momento para refletir e, por que não, aproveitar para pôr umas palavras no papel ou, como queiram, na tela.

Quando jovem, não pensava muito em como eu estaria aos 49. Velho, já com filhos, provavelmente. Bom, os filhos aí estão, mas não me sinto velho. Decerto, os que estão mais à frente na sua caminhada dirão que ainda estou um garoto, enquanto os mais novos e, claro, meus detratores (sempre os há) dirão que já estou velho. Pois não me sinto um homem de 49, não mesmo. Decerto as dores e achaques da idade me fazem lembrar de que garoto já não sou mais, porém ainda sinto que tenho energia para fazer muita coisa.

Ontem, na conversa com minha terapeuta, comentei que essa idade é um marco importante para mim. Sim, estou, mais do que nunca, às portas dos 50, mas a questão é outra. Lembrei que 49 anos era a idade que tinha meu pai quando faleceu. Mil coisas me passam pela cabeça, chego a me comparar com ele, o que é injusto. Ele foi longe para um homem que enfrentou uma vida dura e conviveu com uma implacável anemia falciforme. Apesar dos pesares, gozo de muito boa saúde e tenho me cuidado para ir bem mais longe, por mim e pelos que estão à minha volta.

Mas e a festa? Na verdade, já houve uma pré-comemoração no dia 26/2 e vou terminar de comemorar neste fim de semana. Não sou dado a festanças em datas como esta. Não me lembro da última que organizei. Prefiro uma coisa mais petit comité. E esta quarta vai ser um dia como outro qualquer, gente. É dia útil. Tenho trabalho na minha mesa me esperando, pelo que sou imensamente grato. Tenho lido e ouvido que muitos colegas estão com menos trabalho do que o habitual por causa do coronavírus e por uma ou outra trapalhada que certas pessoas andam aprontando por aí. Por essas e outras, não vai ser hoje que vou parar. Claro, vou ver as pessoas que amo, pelo menos as que estão próximas, cortar um bolinho, cantar um parabéns, já está ótimo. E se tudo der certo, vou para a cama feliz com mais um triunfo do meu Flamengo.

Mas como estou ao iniciar meu quinquagésimo ano de vida? Após um 2019 de muitos sobressaltos, estou bem, estou feliz. Continuo devotando muito do meu tempo ao trabalho, pois quem me conhece sabe que é o que me define, que me preenche, que me mantém vivo. Contudo, tenho procurado cuidar mais de mim, da saúde, tanto física como mental, e tenho buscado dedicar um pouco mais de tempo às coisas que me dão prazer, como a leitura, a música. E vou voltar a estudar. Tradução? De jeito algum. É coisa que tem mais a ver com paixão, com algo que sempre gostei de fazer e que agora resolvi aprender a fazer direito. Tem a ver com amar, como diria Mia Couto. Vai ser um desafio, mas estou disposto a encará-lo.

E falando em amar, tens cuidado do coração, João Vicente, perguntará um ou outro. Sim, claro. Não posso me descuidar dele. O segredo é

Ginástica, ora, que ele agradece;
Serenidade para aceitar o que não consigo mudar; e, claro,
Leveza, pois chega de carregar coisas pesadas.

Até os 50!



sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

Luto

Dormiam no Ninho nossos rubro-negrinhos, embalando o sonho de um dia envergar o Manto Sagrado entre os profissionais do Mais Querido. Nem imaginavam que teriam pela frente um marcador implacável, que os pegaria de surpresa e os tiraria de campo para sempre. Vencer, vencer, vencer, mas hoje, infelizmente, foram vencidos. Chora o futebol, choramos nós rubro-negros, choram, sobretudo, as famílias e amigos desses meninos. Perdemos 10 dos nossos. Que a Magnética saiba homenageá-los na próxima partida. Que os nossos mulambos joguem com ainda mais gana daqui para a frente para honrar-lhes a memória. E, acima de tudo, que se apurem as responsabilidades e que o Flamengo demonstre sua grandeza e acolha devidamente os que precisam ser acolhidos neste momento.

domingo, 31 de dezembro de 2017

Réveillon em Brasília, mas por quê?

É, tenho que admitir que fim de ano na minha terra não é exatamente a coisa mais animada do mundo. Fui dar uma caminhada agora no fim da tarde e praticamente não vi vivalma na rua. Muita gente viaja, inclusive quem não poderia, quem não deveria. Mas voltam, ah se voltam.

Eu estava meio desanimado ontem com esse tal de réveillon. Cheguei a pensar em fazer como era pequeno e simplesmente virar o ano dormindo. Mas hoje de manhã mudei de ideia. “Deixa disso, cara! Se anima! Que dormir nada!” Providenciei o jantar, comprei um espumante para fazer uma graça à meia-noite e, claro, uma garrafa de um bom vinho que tudo fica melhor com um bom vinho.

Mas o melhor veio à tarde, enquanto eu estava na cozinha preparando o jantar. Minha mãe, fazendo as vezes de observadora e ajudante eventual, mandou esta:

— Que bom que você veio passar o fim de ano aqui!

Pronto. Eu não precisava de mais nada. Entendem o porquê do réveillon em Brasília? Naturalmente, os que não estão aqui fazem uma falta imensa, mas vamos nos virar sozinhos. Meu irmão e a Mylena apareceram aqui, claro, para comer do meu peixe, que eles não têm nada de bobos, mas, à meia-noite, seremos só eu e minha mãe. Perfeito. E será o início de um 2018 maravilhoso. Um 2018 que vai ser o meu ano.

Um beijo no coração e que vocês tenham um 2018 extasiante.

P.S.: Hoje nasceu o William, filho do meu amigo Rady. Mais um para engrossar as fileiras rubro-negras e reforçar o time da 105. Seja bem-vindo, garoto!



terça-feira, 8 de julho de 2014

E as lágrimas me correram pelo rosto

E as lágrimas me correram pelo rosto. Eu não chorava por uma derrota numa Copa desde 1986. E como chorei naquela Copa, durante toda a prorrogação e os pênaltis. Tinha 15 anos e via o último suspiro de uma geração maravilhosa, seguramente a melhor desde o tricampeonato; para alguns, a melhor que já tivemos. Mas hoje foi duro, está sendo duro, a dor não supera a de 86, mas algumas coisas vão ficar comigo para o resto da vida. Perder faz parte do jogo, mas perder como perdermos não é fácil. Gols de pelada de churrasco, linha de passe dentro da nossa área. Se nos serve de consolo, redimimos o Barbosa e os jogadores de 50, diminuímos, se nos perdoam os uruguaios, a importância do Maracanazo, se isso era possível. Quando entrou o sexto gol, a goleada clássica, me lembrei dos 6 x 0 que o Botafogo nos impôs e que lhes devolvemos, na mesma moeda, nove anos depois. Mas a lembrança mais amarga que vou guardar desta derrota é a carinha da Clarissa, minha filhotinha, olhando o pai de soslaio, o pai com lágrimas no rosto. Daqui a 10, 20, 30 anos, ela certamente vai dizer: "Eu me lembro daquele jogo, me lembro do meu pai, lágrimas nos olhos, naquela poltrona no canto da sala onde ele gostava de ver o futebol." Não queria deixar essa lembrança para ela, mas há emoções que a gente não segura. Sorte do Rodrigo, que absorto no seu Minecraft, não presenciou esse sofrimento todo. Mas bola pra frente que, amanhã, a vida continua.

quinta-feira, 12 de junho de 2014

Vai ter Copa

Nem o mais pessimista poderia imaginar que um clima tão ambivalente se abateria sobre o país do futebol num momento como este. Esperamos 64 anos para tornar a organizar uma Copa e agora estamos assim? Alguns revoltados, dispostos a quebrar o pau e tudo mais que vier pela frente. Muitos envergonhados, enrustidos, com medo de assumir que vão torcer pelo Brasil. Quem poderia imaginar? Chega a ser surreal. Mas ainda é hora de darmos um jeito nisso.

O problema é que misturaram futebol, a melhor coisa que já inventaram, como diz um caro amigo, com política, ou melhor, com politicagem, corrupção, safadeza, coisas que poderiam muito bem ter ficado sem ser inventadas. Nesses sete anos desde 2007, vimos os bastidores da organização de uma Copa e tudo de pior que ela enseja. Isso maculou a nossa paixão, nos toldou a visão. Será que deixamos de gostar da Seleção? No fundo, no fundo, acho que não.

O gigante adormecido parece começar a se lembrar de que o futebol está no nosso sangue, de que o jogo de bola é paixão nacional, de que a Seleção, embora menos próxima por seus jogadores desfilarem em gramados que não os nossos, ainda faz parte da nossa cultura, da nossa arte. Na última semana, passei a ver mais bandeiras, mais verde e amarelo, um ou outro carro enfeitado, um comércio aqui e ali exibindo as nossas cores. Mas ainda é um movimento tímido. Parece que deixamos para a última hora até o ato de torcer.

Vejo dois motivos para essa timidez: medo e vergonha. Medo de uma represália mais forte, de ter o seu carro danificado ou o vidro do seu comércio quebrado por quem é radicalmente contra a Copa. Vergonha de aderir a tudo isso de ruim que testemunhamos, de passar uma imagem de que somos a favor de governantes que conduziram tão mal um processo que não poderia ter acabado assim, com as coisas inacabadas. Saibamos separar as coisas. Futebol é uma coisa, política é (deve ser) outra.

Eu sei, estamos meio envergonhados porque vem gente de fora e a casa não ficou pronta a contento. A parede está mal pintada, a mancha de xixi da criança continua no sofá, as cadeiras da sala de jantar estão meio bambas. Agora é tarde. Vamos manter a classe e sermos hospitaleiros. É o que nos resta. Torço para que corra tudo bem. Que os jogos sejam bons, os turistas não saiam daqui muito tosquiados e não haja nenhum acidente nessas obras feitas a toque de caixa. Em outubro, a gente se entende com quem muito prometeu, mas não fez o que deveria ter feito.

Numa crônica recente, o Luis Fernando Verissimo dizia que, em 1970, a torcida contra a Seleção, representante da ditadura militar na ideia de muitos, não resistiu à primeira investida do Jairzinho pela ponta direita contra a zaga adversária. Quando o Neymar abrir pela ponta hoje à tarde e for para dentro do João croata (salve Garrincha!), espero ver o mesmo efeito. Que o Brasil inteiro grite junto no primeiro gol. Não podemos deixar que Blatter, Dilma, Valcke, Lula, Aldo Rebelo nem ninguém estraguem esse momento. Vamos juntos rumo ao hexa!

P.S.: Meu palpite para o jogo de hoje? Brasil 2 x 1 Croácia, um do Fred e um do Paulinho, que tem uma sorte danada e vai fazer um gol na nova casa do ex-clube.

A Copa e o tradutor

Corria o ano de 1998. Era a época da privatização das teles. Haviam montado no setor hoteleiro de Brasília, no prédio da Embratel, os chamados data rooms. Lá, as empresas interessadas em participar do leilão tinham acesso a todas as informações sobre as teles a serem vendidas. Só tinha um detalhe: nem uma folha poderia sair de lá. Então, acotovelavam-se advogados, contadores, intérpretes e tradutores para examinar tudo e depois dizer às respectivas matrizes no estrangeiro se o negócio era bom ou não. Uma colega de São Paulo me avisou que uma agência do Rio estava montando uma equipe para trabalhar lá. Eu me candidatei e entrei. Era o começo de uma aventura.

Nesse meio tempo, vivíamos a expectativa da Copa da França. O Brasil faria a partida de abertura do torneio contra a Escócia. No dia, fomos lá conversar com o nosso “feitor” para saber a que horas ele nos liberaria para irmos ver o jogo. O sujeito era americano, não fazia a mínima ideia da importância da ocasião e disse que ninguém sairia para ver jogo algum. Depois de muita conversa, conseguimos que ele nos deixasse sair uma hora antes da partida… mas com a condição de retornarmos uma hora depois do apito final. Melhor do que nada. Eu nem imaginava o trânsito que pegaria para chegar à casa da minha cunhada no Lago Sul. Parte da Avenida das Nações era estreitinha naquela época, não era como é hoje. Foi uma correria louca, quase não chego. Mas tudo bem: vitória do Brasil por 2 x 1 e lá foi todo o mundo comemorar enquanto eu, resignado, voltava ao trabalho.

E prosseguiram a Copa e as traduções nos data rooms. Era dureza, mas tive a felicidade de fazer amizade com um advogado de um grande escritório e isso logo me rendeu frutos. Na última semana da primeira fase, esse advogado me disse que tinha muito serviço de tradução e me perguntou se eu não queria dar uma passada lá no escritório deles para dar cabo disso. Ora se não! No sábado das quartas de final contra o Chile, lá fomos nós. Nós? Sim, eu, de camisa do Brasil (contrariando a recomendação de usar terno e gravata ao visitar um cliente) e um grande parceiro de muitos trabalhos na faculdade, muitas latas de marrom glacê e muitas sessões de Need for Speed antes de trabalhar. Saímos de lá carregados, com serviço para o resto da Copa.

Chegando em casa, transferi meu escritório para a sala, onde estava o TV grande que eu e minha mãe havíamos comprado quatro anos antes para ver o tetra. Computador na mesa de jantar e pau na máquina. Naquela tarde, enquanto trabalhava, vi o Brasil de Ronaldo e Rivaldo atropelar o Chile de Zamorano e Salas. Mas eu não tinha ideia do que estava por vir. Adoeci, peguei o maldito rotavírus. Foi um sofrimento só. Sofria com a Seleção (aquele jogo com a Holanda!), com o trabalho e com as dores no corpo, o febrão e as constantes idas ao banheiro (quem já teve sabe do suplício). As idas foram tantas que tive de comprar até uma boia, daquelas redondas com um buraco no meio, para poder sentar e trabalhar. O show não podia parar.

E veio a final. Acho que o fato de estar tão envolvido com o trabalho acabou sendo positivo. Estava tão lesado que não dei tanta bola para aquele acachapante 3 x 0. Felizmente, estava terminando o serviço e, no dia seguinte, viajaria para esquecer aquilo tudo. Foi uma batalha, mas consegui juntar dinheiro suficiente para dar um giro em Nova Iorque, com direito a Robert Plant e Jimmy Page no Madison Square Garden e Metallica no Giant Stadium, e trazer um laptop de primeira, novinho em folha. Ainda bem que hoje estou em casa, não precisarei enfrentar americano que não entende de futebol nem trânsito maluco. E, claro, espero me manter saudável até o fim da Copa. O sofrimento de torcer já vai ser mais do que suficiente.

Farão falta

Honestamente, tenho me emocionado muito nos últimos dias ao pensar no desprendimento e humildade da nossa “presidenta” Dilma e do nosso ex-presidente Lula. Se oportunistas fossem, poderiam muito bem se aproveitar do evento de hoje à tarde no Itaquerão para se jactarem de terem organizado, com tamanha competência, evento tão grandioso: a Copa das Copas. Sim, graças ao esforço dos dois e de suas equipes, tudo — estádios, aeroportos, obras de mobilidade urbana (transportes?) — ficou pronto dentro do prazo e, mais importante, pouco se gastou. Mas Lula e Dilma não vão aparecer no estádio, não querem os holofotes. Para que roubar as atenções? O trabalho está feito. Hoje é a vez dos meninos que vão entrar em campo envergando a camisa amarelinha. Eu realmente me emociono e, com os olhos cheios de suor, penso: Oxalá Deus dê saúde e vida longa a esses dois grandes estadistas para que se alternem no poder e governem o Salvelindo por décadas e décadas.

segunda-feira, 1 de julho de 2013

Cada coisa no seu devido lugar

Já vou avisando: os adeptos da teoria da conspiração e os que não conseguem separar futebol do resto das coisas podem ficar bem longe. Não preciso de gente chata.

Ah! Foi igual ao que ocorreu em 1998, quando o Brasil entregou a Copa para a França. Prefiro acreditar que o Brasil é freguês da França em mundiais e que os caras jogaram melhor do que a gente naquele dia. Não me venham convencer do contrário. E se você acha que ontem já estava tudo armado, que era mesmo para o Brasil ganhar, que era para apaziguar os ânimos da população, me poupe. Não preciso ouvir isso. Eu e você pensamos de forma diferente e pronto. Respeite isso.

Quanto à turma que não consegue separar futebol do resto... Olha, futebol é só uma diversão. Pulei, torci, gritei, sofri, vibrei, xinguei. Acabou o jogo, acabou. É vida que segue. Temos de trabalhar, temos de continuar a protestar, a tentar consertar o que precisa ser consertado. O Gigante tira as chuteiras e segue na sua luta. E não me venham com aquela história batida de que “é, mas vai ver a educação, a saúde, a segurança na Espanha”. Isso é outro departamento. Se você não consegue separar uma coisa da outra, você é um tonto.

Por último, não acho que esteja tudo pronto para a Copa. Jogamos um partidaço e soubemos enfrentar a Espanha. Luiz Gustavo foi um monstro no meio-campo, Neymar foi Neymar, Fred foi decisivo e nossa dupla de zaga evitou os erros das partidas anteriores. Mas os espanhóis vão querer dar o troco. E ainda tem a Alemanha, a Argentina e a Itália, que mostrou que tem time e fibra para jogar contra qualquer um. A conquista serviu para restabelecer a Seleção como um dos grandes, pois andávamos meio caidinhos, mas falta consolidar essa equipe e o nosso jogo. Que saibamos conter a soberba e não nos esqueçamos de que o caneco importante mesmo é o do ano que vem.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

A tragédia de Santa Maria


Assustadores alguns comentários que li na Internet sobre a tragédia de Santa Maria. Destaco o que li de pior. Uma ou outra pessoa fala em acidente. Se há uma coisa que aprendi nos EUA, foi que não existe acidente. Existe irresponsabilidade, imperícia, desinformação, despreparo, falta de cuidado, falta de preocupação com a vida alheia, uso de material de pior qualidade para economizar. Quando essas coisas se combinam, os efeitos são desastrosos, trágicos, como vemos mais uma vez.

Também me chama a atenção a veemência com que alguns (muitos) saem atirando para todos os lados. Atacam as autoridades estabelecidas. “Isso é culpa dos bombeiros e da polícia que não fiscalizam, que não arrocham!” “São esses políticos vagabundos!” “É culpa da Dilma” (que, por sinal, fez uma coisa digna ao ir a Santa Maria e torna a mostrar uma face humana que raramente se vê no governo). Mas o pior são os brados de que “isso só ocorre no Brasil”. Quem me conhece sabe que, se o negócio é meter o pau no Brasil, tenho sempre uma ou duas coisas a dizer. Critico porque ainda me preocupo, porque moro aqui (aí) e porque gostaria de ver melhorias mais sólidas e rápidas. Mas hoje não.

A culpa não é só do Brasil. Essas tragédias ocorrem em outros lugares, até no chamado primeiro mundo. A primeira coisa que me veio à cabeça quando soube do ocorrido no Sul foi “Great White, Rhode Island”. Há dez anos, em um mês de fevereiro, um incêndio matou 100 pessoas em uma casa noturna naquele estado da costa nordeste americana. As semelhanças são gritantes. A queima do material de isolamento acústico, portas trancadas (só a banda pode sair por aqui), gente pisoteada. Infelizmente não aprendemos com, nesse caso, os erros dos outros. Oxalá aprendamos desta vez, que a tragédia foi no nosso quintal.

Para quem não lê inglês, pega o texto deste link (http://edition.cnn.com/2013/01/28/world/rhode-island-brazil-nightclub-fires/?hpt=hp_t1) e põe no Google Translate. Para isso a tradução automática serve. Vale a pena também dar uma olhada no artigo da Wikipedia sobre o incêndia e o desfecho do processo todo: http://en.wikipedia.org/wiki/The_Station_nightclub_fire.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Casa, comida e… saudade

Na cidade onde moro, há um restaurante de onde costumo pedir comida. Quando pego o telefone para ligar para lá, já vou meio ressabiado. É que lá tem um senhor que não é fácil. Vou discando os números e torcendo para que não seja ele quem atenda. Às vezes a torcida não dá certo e aí se segue um diálogo iniciado mais ou menos assim. Ele atende o telefone e eu digo:

— Boa tarde.

— Como é que é?!

E aí vai mais de um minuto para eu fazer o homem entender que a minha quentinha é pequena, com arroz integral, sem farofa... Houve um dia até em que ele já ia desligando o telefone sem nem pegar nome e endereço. Não sei se ele é moco ou meio devagar mesmo, mas só sei que estou com saudade dele. Não, na verdade estou com saudade da quentinha do restaurante, mas não me importaria se o senhor me fizesse chegar aqui a Santiago uma quentinha daquelas com carne de panela que eles servem às sextas.

Sabe, nesse período aqui, já se vão quase dois meses, descobri que o que faz a nossa casa é exatamente isso: a nossa comida, a que estamos acostumados a comer no dia a dia. Vou tomar a liberdade de modificar aquele velho ditado americano que diz que “home is where home is”. Não é não. “Home is where our food is”, “our food”, claro, no sentido que mencionei. Você pode estar no conforto que for, mas não é a mesma coisa sem a sua comidinha. Agora entendo bem o que sofriam a minha mãe, o meu sogro, a minha sogra quando iam visitar a gente lá nos EUA e saíamos para jantar. Coitados.

Mas não foi hoje que me bateu isso (bateu foi a vontade de escrever). Essa ideia me veio à cabeça fazia 10 dias que eu estava aqui e só tem sido reforçada. E olha que não tenho me alimentado mal. Tenho comido muita coisa de que gosto, peixe, mariscos, empanadas, ceviches, cerejas e nectarinas maravilhosas, mas falta uma coisa. Talvez o problema seja agravado pelo fato de que vamos ficando mais velhos e menos tolerantes. Nosso organismo já não aguenta aventuras e novidades gastronômicas como aguentava antes, quando éramos (mais) jovens. E como ainda sou um “velho” prestes a completar apenas 42 anos, ainda sobra muito tempo para a coisa piorar.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

O sorriso


E assim que saí do prédio hoje de manhã, uma loura alta, bonita, sorriu para mim. Que devaneio! Sorriu na minha direção, só podia ser para outro alguém. Mas um sorriso não é coisa que se ignore. Era o início de mais um dia me sorrindo, me dizendo, “segue em frente, cara”. Sorri comigo mesmo, pois um sorriso lava a alma, inspira, e tomei o caminho do trabalho.

Tenho passado noites ruins, dormido mal. Sou daqueles que dorme e só acorda no dia seguinte. Tenho acordado várias vezes à noite. Sonho com trabalho, já me peguei traduzindo no sonho mais de uma vez. Noite passada, sonhei com beija-flor (com o passarinho, não com a escola de samba, que sou mangueirense), conversei com o Obama. A cabeça anda meio atrapalhada. Tenho trabalhado muito.

Um pouco mais à frente, outro motivo para sorrir: os cachorros espalhados pela rua. Tem uma cachorrada danada solta pelas ruas de Santiago. Lá estavam dois, um macho cortejando uma fêmea, daquele jeito que eles fazem, seguindo e cheirando. Um pouco mais atrás, um pulguento, se coçando. Abri um sorriso porque aqueles três teriam dado uma foto ótima. Há semanas que estou pensando em tirar fotos desses caras. Perdi a oportunidade, mas haverá outras.

Meti uma música no iPod. Grey Street (http://www.youtube.com/watch?v=3sHmx4EgTDo) é, por assim dizer, a música da Clarissa. Na verdade, há várias músicas que me fazem lembrar imediatamente da minha filhota, mas Grey Street foi a primeira. Eu me lembro bem de escutar essa música no carro, dirigindo por Washington, naquele 15 de outubro de 2003, horas depois de ela ter nascido. Passou a ser a música dela.

E continuei minha caminhada para o trabalho, pensando que eu tinha muitos motivos para sorrir. Apesar de uma notícia não muito boa que recebi ontem, segui em frente. Estou cansado, com saudade de casa, do Brasil (imagina?!), mas tenho que estar feliz porque tenho muito trabalho, estou fazendo o que gosto de fazer e as perspectivas são ótimas. E saí pensando naquela inveja boa que bate quando vemos uma pessoa sorridente na rua e não temos a mínima ideia do porquê de tanta alegria. Pois hoje foi dia de os outros sentirem inveja.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Yes, we can! Not quite...

Estava lendo uma matéria no Estadão sobre o primeiro dos cinco shows que os Stones estão fazendo para celebrar os 50 anos da banda. Lá pelo meio do texto, o cidadão que traduziu o que havia sido escrito pelas agências internacionais se sai com o seguinte:

— Não podemos lhes agradecer o suficiente.
Que beleza é o inglês escrito com palavras portuguesas! Quem, em sã (ou mesmo malsã) consciência fala assim? Por que não algo mais natural em português, algo que produza o mesmo efeito?
— Não temos como agradecer a vocês.
Acho que é uma boa saída para o “we can’t thank you enough” dito pelo Jagger. Esse can traduzido como poder me mata. Para, olha, pensa. Nem sempre can é poder.
— I can’t talk right now. Não posso falar agora.
— Muito bem.
— I can’t swim. Não posso nadar.
— Não pode? Quem disse que não pode? Pode sim. Ninguém está te segurando. Pula na piscina. Se você “não sabe nadar”, até melhor. Que você se afogue para nunca mais se sair com uma tradução dessas.


terça-feira, 18 de setembro de 2012

Cada vez pior

Muita gente pronuncia gratuito como se houvesse um hiato ali no meio, como em cuíca ou suíte (está errado; pronuncia-se como circuito, fortuito). Até aí nenhuma novidade. Mas não é que hoje me apareceu gratuíto, assim, com acento agudo no "i". Transformaram o erro de pronúncia em erro de grafia. O pior é que estava em uma mensagem da escola dos meus filhos e, como se não bastasse, foi grafado por uma estudante de Letras. Alguns dizem que não é assim, mas a minha impressão é de que a coisa só piora.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Isto é anúncio que se apresente, Breitling?

"Quando somos apaixonados pela aeronáutica, partilhamos apenas os nossos voos com o mais lendário dos cronógrafos."

Gostou? Eu não. É a chamada da mais recente campanha da Breitling. Está em um anúncio no jornal e vinha me perturbando já há alguns dias. A frase original era esta:

"A man passionate about aviation and fine mechanisms only shares his flights with the ultimate chronograph legend."

Não estou me queixando da adaptação nem da eliminação desta ou daquela palavra. É que a frase em português é ruim mesmo, inclusive porque o "apenas" fora de lugar diz algo diferente do que foi dito na frase em inglês.

Abriram os cofres na hora de contratar o garoto-propaganda (o ator John Travolta), mas, pelo jeito, economizaram no tradutor. Qualquer semelhança com o que se vê por aí nas mais diversas áreas NÃO é mera coincidência.

O pior é que isso não vai afetar nem um pouco a venda dos tais cronógrafos (ou, com um português desses, cornógrafos). No fim das contas, a tradução não faz tanta diferença assim como alguns imaginam que ela faça. É triste, mas muitas vezes é essa a realidade.

quinta-feira, 22 de março de 2012

Faça, seja, tenha

Hoje me deparei com uma notinha aqui no feicibu de uma pessoa atrás de um tradutor para “realizar um trabalho”. Pedia também que entrasse em contato quem se interessasse em “realizar um orçamento”. Duas vezes de uma tacada só é duro. Abusam do realizar. Qual é o problema com o bom e velho “fazer”? Acho que o sujeito deve pensar: “Fazer um trabalho? Que pobre! Vou é realizar um trabalho. Assim ele sai mais bem feito... Opa? Feito? Ah! Sei lá!”

E já que estamos falando disso, de vez em quando vejo por aí agências de tradução que anunciam orgulhosas: “efetuamos traduções”. Efetuamos?! Se o cliente fosse eu, já perderia o interesse e procuraria outra. Deixe o efetuar para operações aritméticas e para pagamentos (que já é uso corrente) e faça traduções.

E antes que eu me esqueça, dê uma chance ao ser e ao ter. Isso constitui a causa do problema. De jeito algum. Isso é a causa do problema. A casa possui sala, dois quartos… Nessa eu não moro. A casa tem sala, dois quartos… Da próxima vez que for escrever, faça, seja, tenha. São mais simples, poupam tinta, papel e tempo do leitor, e dão conta do recado direitinho.