domingo, 8 de janeiro de 2023

Dona Jô e o Dinamite

Quando eu era moleque, costumava pôr em ordem de preferência as pessoas de que eu mais gostava.

— Gosto primeiro do “teu pai”, depois do Zico, e depois da minha mãe.

Clarissa sempre ficou na bronca com essa história. Certa vez, me interpelou:

— Coitada da Vovó Jô, papai!

E eu retruquei:

— Ah, minha filha, é que você não viu o Zicão jogar.

Mas havia outro motivo para eu deixar minha mãe em terceiro. Ela gostava do Roberto Dinamite, o craque do Vasco, arquirrival do meu Flamengo. Eu não a perdoava por isso. Ainda bem que ela entendia o fanatismo do filho, pois o marido era tão ou mais fanático.

Tenho que admitir, contudo, que o Roberto era um tremendo jogador. Aquele gol contra o Botafogo, no Maracanã, em que ele amortece o cruzamento no peito, chapela o Osmar e fuzila de voleio o goleiro é demais! O Clássico dos Milhões, sem Roberto de um lado e Zico do outro, nunca mais foi o mesmo.

Pois Bob, se você encontrar a Dona Jô por aí, dá um beijão nela que ela vai ficar feliz. Vão com Deus!

P.S.: Nos tempos de hoje, com processador de texto, P.S. é um abuso, mas não estou nem aí. “Teu pai” era como eu e meu irmão nos referíamos ao meu pai. Por quê? Sei lá! Talvez porque as pessoas se referissem a ele como o “teu pai” e aí, sei lá, ficou. Nós o chamávamos assim e esse costume só foi abandonado, perto de ele morrer, quando eu estava para fazer 10 anos.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2023

Um velório como ela gostaria

Como de costume, eu tinha o texto quase todo na cabeça, mas agora, ao me sentar para escrever, ele me fugiu. Sei nem por onde começar, mas vamos tentar. 

Velórios são sempre eventos tristes, pesados, dos quais participamos porque devemos. Nunca imaginei que me sentiria bem num velório, que, como dissemos ontem, “curtiria” um velório, ainda mais se fosse o da minha mãe. Mas, João Vicente, isso lá é jeito de dar uma notícia dessas? 

Bom, para quem não sabia, minha mãe já não vinha bem há alguns anos. Em 2018, começou a ter umas isquemias e a saúde foi se deteriorando, num processo difícil. Com o passar dos anos, o que era vida virou sobrevida, sobrevivência. Lutou o quanto pôde, mas nos deixou no dia 31, pondo fim a um sofrimento para nós e para ela. Como bem disse um amigo, resolveu ir num dia em que o mundo inteiro estava soltando fogos... e ainda junto com um papa. 

Mas voltando ao velório, eu estava apreensivo. Como seria, já que eu era, digamos, parte interessada? Pois foi especial! Que bom receber amigos, companheiros, parceiros, colegas, que lá estavam para homenagear minha mãe e nos trazer um carinho, um conforto. Que bom ver gente que eu não via há décadas! Foi tudo muito leve, sereno, tranquilo, num ambiente de muita paz. Tristeza? Sim, mas ela não imperou. Ora, afinal, o sofrimento havia acabado. Ficaram e ficarão, isto sim, as muitas lembranças boas. 

No fim, já na hora de correr para pegar o crematório ainda aberto, vimos como aquilo ali foi diferente. Quem passasse na porta, não imaginaria que, pelos presentes, entre eles, vários amigos da “galera do rock”, tratava-se do velório de uma senhorinha de 86 anos, pediatra, mãe e avó. Não se enganem: Dona Jô era do rock e certamente ficou feliz por ver como tudo transcorreu. 

Para encerrar o dia, após nos despedirmos dela no crematório, fomos jantar para celebrar a vida da mamãe. Eu, Eduardo (meu irmão), Mylena (minha cunhada) e um trio muito importante nesses anos: as cuidadoras, Mariana e Isabel, e a fisioterapeuta, Jéssica, que tomaram conta da mamãe com zelo e carinho. Foi um jantar leve, alegre. Pesar? Claro que os momentos de tristeza, de saudade, vêm — escrevi algumas partes deste texto com os olhos marejados —, mas não devemos nos deixar abater. A morte faz parte, deve ser vivida também. Vamos em frente. Um beijo, mãezinha!