quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Cada uma que me aparece

A gente descobre cada coisa quando faz tradução. Em um documento que acabei de revisar, apareceram unlawful harassment e take unfair advantage of someone. Se você for literal, tirar vantagem de uma pessoa vai ter sempre uma conotação negativa. Ninguém vai acreditar que você tirou vantagem de outrem, mas o fez direitinho, em condições justas. Talvez aí seja o caso de valer-se da ajuda, dos bons serviços da pessoa. Mas divertido mesmo é o unlawful harassment. O americano é tão pudico, conservador e moralista mas consegue enxergar lá um assédio no ambiente de trabalho e dentro da lei. O que diabo é isso? Um assédio light, uma olhadinha sem compromisso, só de esgueira? Povo estranho, hein?! Depois nós morenos é que somos esquisitos.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

A glimpse of the Brazilian translation market

I just came across the website of a translation agency based in São Paulo. Everything looks nice until you start poking around and reading. The list of services they provide includes “version”, a special kind of service you would be hard-pressed to find anywhere else but in Brazil. In the company’s own words, this “consists in passing a text written in Portuguese to another language.” Their São Paulo address is translated into English (So-and-so Avenue...), and they have a "center of attention" (a call center, I suppose). If that is the best English they can come up with for their website, you can only imagine what goes into the translations they produce.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Cadastro positivo 2

Se você chegou aqui sem ter lido o Cadastro positivo original, logo abaixo, vá lê-lo e depois volte. Senão, a coisa vai ficar meio sem pé nem cabeça.

Numa discussão no Facebook sobre esse assunto, surgiram alguns aspectos importates. A consulta de crédito ao SPC, ao Serasa, já é feita pelas empresas há bastante tempo, como mencionou a colega Val Ivonica. A questão é que essa consulta era feita a um cadastro do qual o seu nome só constava se você era mau pagador. Agora, com o cadastro positivo, a ideia é o contrário: se você é bom pagador, o seu nome vai constar do cadastro como tal. Ocorreu-me também um exemplo prático, que ajuda a entender melhor como a coisa funciona nos EUA.

Se uma pessoa chega aos Estados Unidos e vai morar lá por muito tempo, é orientada a arranjar um cartão de crédito e a começar a, digamos assim, tomar dinheiro emprestado. Vai comprar um carro? Não compre à vista, mesmo que você disponha do dinheiro. Compre a prazo e vá pagando o empréstimo direitinho. Assim, você vai construindo seu histórico de crédito e aumentando um número conhecido como FICO. Quando você for comprar uma casa, uma das coisas que vão olhar é esse número. Se ele for alto, você pode ver a taxa de juros cair 0,5%, até mesmo 1%, dependendo da conjuntura. Se você pensar numa casa de 500 mil dólares e um empréstimo de 30 anos, 0,5% fazem uma bela diferença e você economiza bem mais do que teria economizado se houvesse pagado o carro à vista.

Como eu mencionei, a nossa cultura é bem diferente: corra dos juros e, se puder juntar o dinheiro para fazer a compra mais tarde, à vista, faça-o. É esperar para ver como o cadastro positivo vai se encaixar nessa realidade.

Cadastro positivo

Discute-se atualmente no Brasil o tal cadastro positivo de consumidores. Mas do que se trata? Bom, até hoje, para ter o nome limpo na praça e acesso a crédito, basta pagar suas dívidas em dia. Assim, você evita que o seu nome vá para o SPC, para o Serasa. Ou seja, se o seu nome não aparece na lista, você está tranquilo. Mas o cadastro positivo vem para mudar isso. A ideia, semelhante ao que se vê em países como os Estados Unidos, é que o consumidor deve construir um histórico de crédito, ou seja, fazer dívidas e honrá-las, pagando tudo direitinho. Assim, você mostra que tem capacidade de tomar empréstimos e pagá-los. Mas será que isso dá certo aqui no Brasil?

Eu tenho sérias dúvidas. Se compararmos o Brasil com os Estados Unidos, por exemplo, temos ambientes bem diferentes. Aqui, vocês hão de concordar, comprar a crédito é dureza. A maioria da população compra dessa maneira, mas o faz de mau grado. Quem gosta de pagar até o dobro do preço à vista por um produto? Quem pode e tem um pouquinho de traquejo ainda consegue poupar, investir o dinheiro e comprar à vista, pois o negócio é evitar as taxas de juros escorchantes cobradas no Brasil. Ou seja, toma-se emprestado apenas em último caso. Como é que se constrói um histórico de crédito se não se toma emprestado? E essa história de que um bom histórico de crédito lhe permitirá obter taxas mais baixas dos vendedores não me convence.

Isso tudo me faz pensar em outra diferença entre Estados Unidos e Brasil. Comprar na terra do Tio Sam é muito fácil, uma coisa prazerosa. Compra-se feliz, pois você sabe que está levando um produto de boa qualidade, a um preço razoável e a uma taxa de juros que não te tira o couro. Quando comprei o último carro que tive nos Estados Unidos, paguei 2,99% de juros... ao ano. No ápice da crise, um ex-colega de FMI me apareceu de carro novo. Perguntei-lhe quanto havia pagado de juros. Caí pra trás ao ouvir 0,89% ao ano e quase corri à loja para aproveitar essa pechincha. Aqui, 0,99% ao mês já é um bom negócio. Desse jeito, é aquele sofrimento na hora de entregar o nosso suado dinheiro para o vendedor. O produto não é lá essas coisas, o preço é alto e ainda vamos pagar uma boa grana de juros. Você sai da loja tentando se convencer de que fez um bom negócio. Se a sensação na hora de comprar fosse menos dolorosa, compraríamos ainda mais, o que aumentaria a atividade econômica e traria vários benefícios. Mas, infelizmente, parece que ninguém pensa nisso.

sábado, 4 de dezembro de 2010

Tradução biunívoca? Com certeza!

Tradução cada vez mais é uma correspondência biunívoca. Uma palavra de uma língua não raro acaba sendo traduzida sempre da mesma forma. O tradutor não para pra pensar que aquilo não é idiomático, não é o sentido do texto original ou, simplesmente, é um erro crasso. Hoje me apareceu no Estadão um 'definitivamente' mal empregado no caderno de Esportes. O contexto deixava mais do que claro que o texto em inglês dizia definitely, palavra para a qual o tradutor tinha várias opções em português: sem dúvida, decerto, é claro que… Ele tinha até o 'com certeza', que, por ser usado e abusado, já me parece de gosto duvidoso. No Brasil de hoje, se você faz uma pergunta que provavelmente receberá uma resposta afirmativa, há uma boa chance de o interlocutor mandar de lá um: “Com certeza!” Virou praga.

Mas voltando à tradução biunívoca, os tradutores não percebem que, dessa forma, estão entregando o ouro ao bandido. Ora, se basta trocar uma palavra por outra, o que, grosso modo, equivale a apertar um botão, qualquer um pode fazê-lo. A tradução por máquina se encaixa perfeitamente aí. Abram o olho, tradutores, pois, ao traduzirem mal e, em consequência, denegrirem o nosso ofício, vocês estão cavando a própria cova... e cada vez mais rápido.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Mais uma da nossa equipe econômica

A febre do paciente está subindo. Vem o médico e, em vez de atacar as causas, sugere usar um termômetro que resulte numa leitura mais baixa. Lindo, não?! É o que Mantega quer fazer com essa história de tirar os preços dos alimentos e combustíveis do cômputo da inflação para mantê-la dentro da meta. Desse jeito, nossas contas e números ficarão como os da Argentina, sem a mínima credibilidade.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

O Natal deles

Hoje se comemora nos Estados Unidos o Dia de Ação de Graças (Thanksgiving Day). Daqui a algumas horas, normalmente por volta das 17h, os americanos se sentarão à mesa para comer o chamado Thanksgiving Dinner. É, talvez, a festa mais importante para eles. Para mim, é como se fosse uma ceia de Natal. Ora, em que outra ocasião aqui no Brasil as famílias se reúnem em volta da mesa para se confraternizar e desfrutar de um belo peru?

Uma lembrança que guardo das quintas-feiras como a de hoje é a quantidade monstruosa de encartes das mais diversas lojas que vinham junto com o jornal. Neles, podia-se conferir todas as ofertas do comércio no dia seguinte. Era uma das diversões do dia, enquanto se esperava o jantar ficar pronto. E tome laptop, videogame, TV de tela plana com descontos de 50% ou mais. As ofertas eram realmente imperdíveis, mas o sujeito tinha que ter muita coragem para enfrentar o frio (por volta de zero grau) e a multidão enlouquecida, desesperada para comprar tudo o que via pela frente.

E a coisa não era fácil. Afinal de contas, para aproveitar as melhores ofertas era preciso chegar primeiro. As lojas normalmente abriam às 5h da matina e muitos acampavam na porta desde a noite anterior. Era gente que não acabava mais. Houve um ano, acho que 2008, quando um funcionário do Walmart morreu pisoteado pelo povão. O pior foi que ninguém interrompeu as compras, mesmo depois que circulou a notícia de que um funcionário havia morrido. Não justifica, mas é bom lembrar-se de que ir às compras é o esporte favorito do americano. O Black Friday é a final da Copa do Mundo para eles.

Mas que história é essa de Black Friday? Sexta-feira Negra? Talvez azul, mas negra não. Diz-se que, originalmente, a última sexta-feira de novembro foi assim batizada pelo Departamento de Polícia da Filadélfia porque aquele era o dia de mais congestionamento no trânsito e movimento nas ruas. Em outras palavras, um dia negro para quem tinha que tomar conta da população. Isso foi lá pelos anos 60, se não me engano. Anos depois, surgiu outra teoria. Chamavam de black porque era o dia em que muitos comerciantes conseguiam vender o suficiente para sair do vermelho. Enquanto aqui a gente usa a cor azul para representar números positivos, lá eles falam em preto. Mas vermelho é vermelho aqui e lá. E vendem muito mesmo. Eu me lembro de ter lido uma vez um artigo que mencionava que naquele dia entravam milhões e milhões de dólares só nos caixas do Walmart. Era uma cifra espantosa.

Interessante também foi ver nesses anos como os comerciantes e a vontade de comprar foram corroendo a tradição. Já há lojas que abrem na noite da quinta-feira. Você enche o bucho de peru, toma lá uma ou duas taças de vinho, pega o casaco e vai à luta atrás das melhores promoções. O comércio pela Internet tampouco deixa barato. As promoções começam já no início da semana. E nos últimos anos, crescem as vendas no que eles chamam de Cyber Monday. O raciocínio é que, ao voltar ao trabalho na segunda-feira, as pessoas vão sentar à frente do computador e aproveitar para fazer umas comprinhas pela Internet. E tome descontos para atrair o freguês. E isso é só o início da temporada de compras de fim de ano.

Nós, particularmente, nunca tivemos coragem de tentar pegar as ofertas da madrugada. Era muito trampo para pouco benefício. Normalmente, passávamos o olho nos encartes do jornal na noite anterior e tomávamos nota de uma ou outra promoção. Algumas iam até as 10h, até o meio-dia. Fazíamos um roteirozinho e saíamos depois do café, sem pressa. Nos últimos anos, eu ia sozinho ou deixávamos as crianças com alguém. Entrar numa Macy’s, por exemplo, num Black Friday, com duas crianças a tiracolo, é jogar pedra na cruz. As aglomerações e filas foram sempre enormes, mesmo em 2008 e 2009, com o fantasma da crise financeira à solta.

Mas o bom mesmo era o jantar, sobretudo na casa da Glaura, grande amiga e cozinheira de mão cheia. E tinha a pecan pie feita pelo Henrique, que era de primeira. Daria um dedinho do pé por uma torta daquelas. Algumas vezes o jantar foi lá em casa. Apesar de brasileiros, não havia motivo para não seguirmos a tradição local. Neste ano, para a data não passar em branco, vamos fazer um Thanksgiving Dinner na casa de amigos americanos, aqui na cidade mesmo. Não vai ser hoje, mas sim no domingo. Ora, vocês queriam o quê? Quinta-feira, aqui em terras tupiniquins, é dia de trabalho.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Terrorismo

Quando vim embora dos Estados Unidos no começo do ano, umas pessoas me felicitaram e me disseram mais ou menos o seguinte:

"Que bom que você veio de lá. Aqui no Brasil, pelo menos, não tem terrorismo."

Olha, se o que está ocorrendo no Rio não é terrorismo, devo ter desaprendido o significado da palavra.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Não tem problema, ninguém está vendo...

Hoje de tarde, estava eu lá na Avenida Bady Bassit (sim, em São José do Rio Preto), por volta das 15h, quando passou um Toyota Corolla. A rua estava praticamente deserta, não havia ninguém vendo, então o motorista achou que não haveria problema algum em jogar pela janela uma garrafa de refrigerante daquelas de 600 ml. A garrafa caprichosamente quicou, rolou e entrou por um bueiro. Falta de civilidade, de consciência. Depois vai ser o primeiro a reclamar quando vierem as chuvas de verão e a rua ficar alagada, intransitável. Se há justiça neste mundo, a Bady vai alagar quando aquele Corolla estiver passando por lá. Vai entrar água no carro, estragar o estofamento... E, desesperado, o motorista nem se lembrará da garrafa atirada pela janela naquele 15 de novembro.

Isso me fez lembrar de uma vez em que vi a mãe de um amigo, uma dona chique, moradora de uma bela mansão no Lago (não digo qual), jogar lixo pela janela enquanto o motorista contornava o balão da 102 Sul, da Rua das Farmácias. Nunca mais olhei para aquela senhora do mesmo jeito. Que gentalha! Como diria a minha avó materna, analfabeta porém arguta como poucos, "quanto mais rico, mais ridículo".

Tropa de Elite 2

Ontem, finalmente, pude assistir a Tropa de Elite 2. É um filmaço! Achei melhor do que o primeiro, mais maduro e, acima de tudo, o considero mais um filme político do que simplesmente um filme de ou sobre violência. Mas não será um filme fácil de ser digerido pelos gringos, que, por não conhecerem bem o Brasil, provavelmente o encararão apenas como mais um filme de "polícia e ladrão". Não tem nada a ver com a violência mostrada, por exemplo, nos filmes do Tarantino. E, apesar de ser uma obra de ficção, muito do que o filme apresenta reflete a nossa realidade. Isso talvez seja o que ele tem de melhor e mais contundente.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

O que é fabuloso para você?

Há poucos dias, encontrei em duas redes sociais na Internet uma referência a uma entrevista sobre a nossa profissão, concedida por uma colega tradutora a uma rádio dos Estados Unidos. A pessoa que fazia a referência, também do nosso meio, havia usado dois adjetivos em inglês: fabulous e outstanding. Fiquei imaginando do que poderia tratar essa entrevista para merecer esses elogios. Bom, fui logo
ouvi-la. Confesso que não fiquei tão impressionado quanto a colega.
A entrevista era curta, tinha um trocadilho bem interessante (fowl e foul), chamava a atenção para alguns aspectos pitorescos do nosso métier, mas classificá-la como excelente e fabulosa era de certa forma um exagero.

Naquele mesmo dia, reparei que a colega que havia elogiado a entrevista e uma outra colega, ambas residentes nos EUA, haviam comentado sobre o último Congresso da Associação Americana de Tradutores, realizado na semana passada, em Denver. Ambos opinaram que o congresso havia sido “fabulous” (de novo?!). Concordo que esses congressos são sempre muito proveitosos. Você tem a chance de conhecer novos clientes, fazer novas amizades, assistir a uma ou outra palestra interessante e sentar com um colega, com quem só tem contato por email, para almoçar ou tomar um vinho, mas a coisa não vai muito além disso. Eu não chamaria de fabuloso nem o encontro da ABRAPT na UFMG, em 2001, ocasião que conheci a Érica, minha mulher e mãe dos meus dois filhos.

Isso tudo me fez lembrar de algo que eu havia reparado durante o período em que morei nos Estados Unidos. Os americanos tinham lá certa queda por pecar pelo exagero ao usar os adjetivos. Alguém pode argumentar que gente deslumbrada existe em tudo que é canto, mas a frequência com que eu via esse deslumbre era maior lá. Comecei a perceber que, o que aos meus olhos parecia um exagero era também uma marca do discurso deles. Uma vez, por exemplo, na escola da Clarissa, houve uma apresentação em que as crianças da primeira e segunda série cantaram duas canções tradicionais, acompanhadas pela professora, que tocava piano. Ao fim da apresentação, um dos pais, conhecido nosso, exclamou: “that was amazing”. Amazing?! Tudo bem, eram as nossas filhas lá no palco, haviam cantado direitinho, bonitinho, mas achar aquilo espantoso era demais. Eu provavelmente soltaria um “that was great”, que ficaria de muito bom tamanho. Mas isso sou eu, falante nativo de português.

O leitor deve estar se perguntando por que o chato aqui fica prestando atenção no que os outros falam e pegando no pé das pessoas. Não é (só) chatice. Digamos que é também um exercício linguístico. Quando me deparo com uma frase, uma expressão, uma palavra, me pergunto o que eu faria se tivesse de traduzi-la. Para mim, traduzir é, acima de tudo, dizer na língua de chegada o que um falante dessa língua diria caso se encontrasse na mesma situação em que se encontra o falante da língua de partida, procurando causar o mínimo de estranhamento possível. Mas aí, alguns poderiam argumentar, eu deixaria de trazer traços da cultura alheia para a cultura da língua de chegada. Alguma coisa se perde, é inevitável. Que caminho tomar? Respeitar a marca do discurso e manter o exagero, correndo o risco de causar espécie ao leitor, que poderia até achar que o tradutor errou na mão, ou simplesmente modular o texto e optar por uma solução mais inócua. Nos dois casos, das tradutoras e do pai, eu provavelmente manteria o exagero, o deslumbre, mas eis um caso em que a modulação é obrigatória.

No ano passado, eu estava assistindo a uma aula de duas professoras sobre interpretação (community interpreting, para ser mais preciso, coisa comum nos EUA, mas praticamente inexistente aqui no Brasil). Em dado momento, uma delas fez um comentário. Em seguida, a outra disse o seguinte: “I’m so glad you made that comment”. Gente, o que terá dito a primeira que proporcionou tanto prazer, tanta alegria, à colega? Não me lembro mais do comentário, mas não me esqueço de que o semblante da segunda professora não mudou absolutamente nada. Não houve essa alegria que as palavras dela poderiam levar um tradutor incauto a imaginar. Mesmo sem saber desse detalhe, um bom tradutor teria modulado a frase e escrito algo como, “que bom que você fez esse comentário”.

Para encerrar, acho que vale a pena prestarmos atenção ao nosso discurso e medirmos nossas palavras. Quando mal usadas ou usadas em excesso, as palavras perdem a sua força. Para eu me referir a algo como fabuloso, ele tem que realmente ser fabuloso. Para fazer um trocadilho, caso pudéssemos voltar no tempo, ver um show dos Beatles, The Fab Four, seria algo fabuloso. Ou então o que li hoje no Estadão, no caderno Cidades. Em São Paulo, existe um grupo de balé formado majoritariamente por meninas cegas. A Associação de Ballet e Artes para Cegos Fernanda Bianchini é o único grupo de balé clássico profissional de deficientes visuais no mundo. Isso, sim, é fabuloso. E para quem quiser ver as meninas em ação, ao vivo, elas se apresentam hoje à noite, às 20h30, no Teatro Ítalo-brasileiro, na Avenida João Dias, 2046.

E tome dólar...

Com a taxa de juros já no chão, só resta às autoridades americanas aumentar a liquidez da economia. É isso ou enfrentar uma nova recessão, coisa que ninguém no mundo gostaria de ver. Agora, com essa injeção de US$ 600 bilhões nos próximos meses, quero ver qual é o coelho que o Mantega vai tirar da cartola para conter a subida do real. Não vai ter elevação do IOF que chegue. Mas não vão pensando que torço contra. Quero mais é que o dólar suba mesmo.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Contabilidade criativa

Deve-se admitir que a criatividade no trato das contas públicas no Brasil não vem de hoje. O tal do superávit primário, que não se vê em nenhum outro lugar do mundo, já existia no governo FHC. Agora, o que a equipe econômica atual vem fazendo é incrível. É dinheiro que o Tesouro empresta para o BNDES para comprar ativos aqui, injetar ali, emprestar acolá. E a dívida pública continua a mesma, segundo as autoridades. Daqui a pouco isto aqui vira a Argentina, cujas estatísticas e contas ninguém mais leva a sério.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Ideia de jerico

"A gente vai na noite anterior e espalha um monte de folhetos e santinhos nas imediações das seções eleitorais. No dia seguinte, o eleitor vai pegar um do chão e votar no nosso candidato. Não tem erro." Alguém conseguiu votar em uma seção eleitoral onde isso não ocorreu? Parece que não se dão conta de que vão sujar a cidade, entupir bueiros. Ora, qual é o problema? Ninguém é multado, não vão obrigar o candidato porcalhão a pagar pela limpeza. Fica por isso mesmo. Só em São Paulo, recolheram 170 toneladas de material de campanha das ruas. É o Brasil que me enche de orgulho!

sábado, 2 de outubro de 2010

O negócio é o viés

Antes que a minha mãe ou algum outro leitor reclame de eu ter escrito em inglês, segue uma tradução livre, bem livre.

Uma das principais manchetes no site da CNN hoje é “Ex-guerrilheira concorre à presidência no Brasil”. O link vai cair num artigo com o título “Ex-guerrilheira marxista concorre para ser a primeira presidente do Brasil”. Fico pensando que sensação uma frase como essa provoca ao norte do Rio Grande. Os americanos de direita podem até pensar: “Ai meu Deus, o Brasil vai virar uma Venezuela. Temos que fazer alguma coisa. Calma, o bicho não é tão feio quanto parece. É certo que a Dilma e o PT têm um quê de socialismo, o que é um eufemismo, mas os tempos são outros. O mais importante é que estou convicto de que existem pesos e contrapesos suficientes para evitar que eles transformem o país em algo que possa ser fonte de preocupação. A outra possibilidade é que a CNN estava apenas tentando atrair a atenção dos leitores. Alguma coisa como “Candidata do Lula rumo à vitória no Brasil” não teria surtido o mesmo efeito que o título escolhido, pois muitos dos americanos que apenas olham para o seu umbigo provavelmente pensariam, “Quem é esse tal de Lula? E daí?” Não, ainda acho que, mais do que qualquer outra coisa, foi viés mesmo.

It’s all about bias

One of the top stories on CNN's website today is “Ex-guerrilla vies for Brazil's presidency”. The link takes you to a story entitled “Former Marxist guerrilla vying to be Brazil's first female president.” It leaves me wondering what kind of feelings that provokes north of the Rio Grande. Right-wing Americans might even think, "Oh! My God, Brazil is turning into Venezuela. We have to do something about it!" Easy, that’s not as bad as it looks. Ms. Rousseff and her Workers’ Party certainly have a red, socialist tinge, to put it mildly, but times have changed. More importantly, I strongly believe there are enough checks and balances in place to keep them from turning the country into anything that could be cause for concern. The other possibility is that CNN just went for the attention grabber. Something in the vein of “Lula-groomed candidate poised to take victory in Brazil” would not have produced the same effect as the title they chose, as many navel-gazing Americans would likely go, "Who is Lula anyway? Who cares?" Nope, I still think it's more about bias than anything else.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Mas que lambança

Esta eleição vai entrar para a história, mas não propriamente pelos candidatos ou pelas campanhas que se viram até aqui. Para falar a verdade, fiquei meio decepcionado com o que vi, ou melhor, com o que não vi. Talvez o problema seja que a minha principal referência é a eleição de 1989, a primeira eleição direta desde aquele em que se elegeu Jânio Quadros. A de 1989 foi uma festa. Todos queriam mostrar que apoiavam este ou aquele candidato. Era bóton na roupa, bandeira para todo lado, adesivos nas janelas, nos carros. Vi muito pouco disso. Parece que o conformismo dominou a população. Claro, os meios hoje são outros. Muito da campanha passou para o Twitter, o Facebook, o email, mas, mesmo assim, Dilma já entrou praticamente vencedora e Serra e os demais já começaram meio que derrotados.

Mas eu dizia que esta eleição vai entrar para a história. É por causa da lambança que fizeram. Vamos às urnas no domingo sem sabermos ao certo de que documento precisaremos. A rigor, com a decisão de ontem do STF, basta levar um documento com foto; o título de eleitor, que muita gente ficou na fila para tirar na última hora, não vale nada. Mas e se um mesário desinformado resolve criar caso e não deixar um eleitor sem título votar? Isso vai dar confusão. O mais lamentável dessa história toda é que isso tudo não precisava ter ocorrido. Todos os partidos haviam concordado que o título e um documento com foto eram necessários. Mas aí o PT (e não é porque foi o PT, fosse quem fosse) se dá conta de que corre risco de perder votos e resolve entrar com aquela ação de inconstitucionalidade aos 45 do segundo tempo. Grande PT!

Mas a lambança não fica só aí. Votaremos no domingo, mas a decisão final poderá ser no tapetão, e o que é pior, do STF. O seu candidato pode ganhar, mas não levar. Se um candidato ficha suja for eleito e o STF decidir, sabe lá Deus quando, que a Lei da Ficha Limpa já vale a partir de agora, como é que fica aquele sistema louco do quociente eleitoral? A contagem seria toda alterada, imagino. Li há pouco que o TSE vai divulgar à parte os votos de quem teve a candidatura barrada por causa da nova lei. Por via das dúvidas, o melhor é só comemorar depois que o Supremo chegar a uma decisão. E o meu medo é que, na hora do desempate, já saberemos quem poderá ser beneficiado caso a lei passe a valer a partir deste pleito ou do próximo. Isso pode, por que não, influenciar a decisão. É esperar para ver.

O debate da Globo

Achei o debate morno, chato, anticlimático. Esperava um pouco mais, pois era o encerramento da campanha, a última chance de deixar sua marca e buscar uma virada ou consolidar a vitória. Está certo que o formato meio que engessa, mas faltou contundência. Plínio até que tentou atacar, mas ele mais diverte do que realmente impressiona. E suas ideias, como recorrer ao calote na dívida, são o fim da picada. Podem funcionar na cabeça dele, mas na vida real não. O Brasil e tantos outros países precisam se endividar porque o que arrecadam não cobre as despesas. Se você dá um calote, vai ficar mais caro para conseguir encontrar financiamento. Ora, não pegou emprestado? Então paga.

Quanto aos outros três, Dilma foi pouco ameaçada e mostrou-se atrapalhada na hora de falar. Mas não foi nada que lhe vá tirar votos no domingo. Serra falou bem, tentou mostrar sua experiência, mas não teve coragem de cutucar Dilma como deveria, sobretudo em vista da necessidade de arrancar-lhe votos para buscar um segundo turno. Marina foi um pouco mais incisiva, mas ficou aquém do que eu esperava. E no fim das contas, ninguém falou em Erenice Guerra, corrupção nos Correios, tráfico de influência na Casa Civil, censura à imprensa, loteamento de cargos no próximo governo. Foi prudência demais para o meu gosto.

Na verdade, o debate foi praticamente uma extensão do que se viu na campanha. Uma campanha para prefeito, como disse várias vezes a jornalista Lucia Hippolito. Foi construção de escola, de casa popular, compra de ambulância, bolsa-isso, bolsa-aquilo, coisas que ficariam melhores numa campanha municipal. Pouco se discutiram programas de governo. Temas macro, como política econômica e política externa, que se esperariam numa disputa presidencial, pouco apareceram. Mas isso é o que o Brasil comporta. Só dá para falar em coisas comezinhas senão nossa massa de semiletrados não consegue acompanhar e aí lá se vão os votos pelo ralo.

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Paul McCartney

Li hoje no jornal que o Paul McCartney vem tocar no Brasil em novembro. Maravilha! Mais uma chance de ver um dos melhores compositores que já apareceram por aí e o líder da melhor banda da história. Pensei em levar a Clarissa, que está começando a conhecer os Beatles. Primeiro foi a música do filme da abelhinha (Bee Movie), Here Comes the Sun. Num dia desses a peguei cantarolando “I’d like to be, under the sea, in an octopus’s garden...”. Ela me disse que estava aprendendo a música na escola. Outra que vem fazendo sucesso aqui é When I’m Sixty-four.

Mas eu ia dizendo que pensei em levá-la ao show do Paul. Mudei de ideia rapidinho. Para começar, o ingresso deve sair uma nota. Se o do Rush já foi caro, não quero nem imaginar. Shows são muito caros no Brasil. Concordo que não sai barato trazer um artista de fora com aquela parafernália toda, mas a turma mete a faca. É o custo Brasil. E para terminar, vai ser muita gente. Em outros lugares, até daria para ir, a despeito da multidão. A coisa é organizadinha, você estaciona perto do local do show ou vai de metrô, fica todo o mundo sentadinho. Mas aqui na Pindorama ainda estamos longe disso. E ainda tem o fato de brasileiro ser mal-educado, índio, no sentido pejorativo da palavra. Vai ser aquele empurra-empurra, aquela confusão. É um risco que uma criança de sete anos não precisa correr. Espero que, no futuro, ela me perdoe por não tê-la levado.

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Droga de eleição

Esta eleição está uma droga, convenhamos. Campanhas desanimadas, o Tiririca, a Mulher Pera (ê), o marido safado que renuncia à candidatura em favor da mulher, as dúvidas causadas pelos impasses do STF, que não resolve nada. Pelo jeito, os fichas-sujas vão concorrer. E se forem eleitos? Bom, até aí nada demais, sempre foram eleitos. Mas, se forem cassados depois, vai ser um rebu danado. Um documento ou dois na hora de votar? Isso já havia sido resolvido entre todos os partidos há um ano, e aí vem o PT bagunçar o coreto porque se deu conta de que muitos de seus eleitores podem ser impedidos de votar. Ai, Brasil...

O pior é que, desde a volta das eleições diretas, sempre tivemos pleitos que, de modo geral, transcorreram muito bem. Servimos de modelo de democracia para vários países, inclusive os EUA, onde houve aquele caso ridículo na Flórida, na eleição do Bush Filho. Lembram-se? Precisaram decidir a eleição no tapetão. Chegaram à insanidade de discutir se eram válidos os cartões de votação que haviam sido mal perfurados e haviam ficado com aquele pedacinho de papel pendurado. Pensando bem, não sei se piores somos nós ou eles. Os americanos, supostamente mais inteligentes, espertos e aculturados que nós, latinos, mulatos inzoneiros e semiletrados, elegeram presidente um pateta que nem o Bush. Não dá mesmo para entender a cabeça dos eleitores. Que venha o 3 de outubro para provar que estou certo.

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

A remuneração dos tradutores e outras coisinhas afins

Caro leitor, este artigo está, digamos assim, um tantinho desestruturado. O que era para ser apenas respostas breves aos comentários feitos pelo colega Víctor Gonzales sobre o texto “A remuneração dos tradutores”, acabou ficando maior do que eu esperava. Assim, em vez de simplesmente dar minha resposta no campo para comentários daquele artigo, resolvi juntar os parágrafos abaixo e publicá-los como um novo texto. Além disso, minhas respostas abordam vários pontos importantes que teriam menos visibilidade se aparecessem apenas como um comentário. Então vamos a elas.

Será que a falta de união é exclusiva dos tradutores? Provavelmente não. Acredito que, em todas as profissões, vai haver um puxando o tapete do outro, um querendo roubar o cliente do outro, defender seu território. Será que se fala de preços em outras profissões tanto assim quanto se pensa? Para falar a verdade, não sei. Mas não consigo imaginar médicos se reunindo num simpósio e discutindo quanto devem cobrar por uma consulta ou escritórios de advocacia se consultando para saber quanto devem cobrar de honorários.

Cobrar por palavra, lauda, caractere (com ou sem espaço), peso, baciada, metro... Tanto faz. É apenas uma convenção. Para ser sincero, acho que saímos perdendo nessa história. Eu preferiria pegar o original, avaliar a dificuldade, estimar o tempo que vou levar para fazer o serviço e dar um preço fechado. Menos transparente? Por quê? Vamos supor que você contrate um pedreiro para construir um muro em volta da sua casa. Você o acusaria de pouco transparente se ele não te cobrasse pelo número de tijolos? Não acho que as diferentes formas de cobrança de um serviço de tradução sejam empecilho. O subjetivismo talvez seja o mesmo quando se compara um médico que cobra 150 reais e outro que cobra 300 reais por consulta.

No que diz respeito a novatos cobrarem barato, muita calma nessa hora. Coloque-se no lugar de um novato. Ao iniciar na profissão, quem tem peito para já sair cobrando caro? Você pode até entrar no mercado com seu preço lá em cima, mas quem vai decidir se aquele preço é cabível, não é você; são os clientes. Às vezes cola, mas é mais provável que você vá ouvir dos clientes que ainda está muito verde para cobrar aquilo tudo. Quanto a se valer de um revisor, lembre-se de que você precisa pagar pelo serviço dele e isso pode acabar reduzindo demais a sua margem de lucro. Você pode também trabalhar junto com um colega e um revisar o trabalho do outro, mas vão ter que dividir o que ganharem.

Os estudantes de tradução devem adotar uma postura mais ativa. Não podem esperar que as coisas vão ser dadas de mão beijada. Tem que correr atrás, se informar, ir a palestras e congressos, participar de listas de discussão, grupos virtuais, redes sociais. Isso tudo ajuda a entender como funciona a profissão e o mercado e dá visibilidade a quem está começando. Não sei lhe dizer exatamente por que havia poucos estudantes no evento do ProZ, mas não o tome como regra. Frequento eventos como esse desde 1998 e os estudantes sempre comparecem. Normalmente, são presença mais forte em eventos organizados por instituições de ensino, mas também vão aos mais voltados para tradutores.

Quanto ao problema de os tradutores da mesma língua se enxergarem como verdadeiros parceiros e não como concorrentes, é difícil separar as duas coisas, sobretudo no caso dos que ainda não se firmaram no mercado. Todos os tradutores que trabalham com a mesma língua que eu são meus concorrentes, claro, mas, acima de tudo, são parceiros e possíveis fontes de serviço. Nós somos de carne e osso e nosso dia tem apenas 24 horas. É mais comum do que alguns imaginam ver-se em situações em que é impossível dar cabo do serviço sozinho. Da mesma forma que isso ocorre com você, também ocorre com um colega, que pode lhe pedir socorro. É preciso apenas que você esteja preparado para ajudar quando esse pedido chegar.

Em minha palestra no evento do ProZ, há duas semanas, falei sobre essa questão dos pares. Admiti que é mais difícil ser recomendado por um colega que traduz para a mesma língua que a nossa, mas não é impossível. Eu, por exemplo, vou passar o nome de uma colega que estava lá no ProZ para um cliente meu. Ela se encaixa bem no perfil de tradutor de que eles precisam. Claro, vou recomendá-la porque ela me parece ser uma pessoa séria e competente. Se eu não tivesse essa percepção, não a recomendaria. Afinal, a minha reputação está em jogo também quando indico alguém. E tampouco se esqueça de que, não raro, recomendações vêm de colegas especializados em áreas que não a sua e de tradutores que trabalham com outras línguas.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

A remuneração dos tradutores

Há algumas semanas, estou com um texto no forno sobre esse assunto, que sempre provoca muita discussão e causa bastante polêmica. Outros compromissos, como trabalho e a participação como palestrante num evento de tradução em São Paulo não me permitiram concluí-lo antes, mas nada como um empurrãozinho para fazer você terminar um texto. Logo mais à noite, o colega e amigo Danilo Nogueira discutirá esse mesmo assunto na já tradicional reunião da Sala 7 (com repeteco no sábado). Como acredito que nós dois pensamos de forma muito semelhante sobre esse tema, é melhor publicar logo as minhas opiniões para depois não ser acusado de estar me aproveitando das ideias dele.

Há algumas semanas um comentário meu no Twitter suscitou uma breve discussão entre colegas tradutores sobre remuneração. Fiz esse comentário após ler o tweet do colega João Roque Dias, tradutor técnico português, que dizia o seguinte: “No Peanuts! for Translators: If You Are Not a Monkey, Stop Working for Peanuts: http://bit.ly/bLyagj Read and Retweet!” A ideia é que os tradutores não devem aceitar trabalhar por mixaria. Tenho comigo que circular essas mensagens para que os tradutores, ou outros profissionais, não trabalhem por mixaria é fácil. Definir o que é mixaria é que são elas.

Eis o principal problema quando se discute remuneração de tradutores. Ora, a mixaria para um pode ser o suficiente para pagar as contas do outro e manter o cobrador afastado. Fazendo um paralelo com o que dizia o folclórico Dadá Maravilha (“Não existe gol feio, feio é não fazer gol”), costumo dizer que mais feio do que trabalhar por pouco é não ter com que pagar as contas. Isto sim é um problema. Cada um sabe das suas contas, das suas dívidas, de onde o calo aperta, e ninguém deve dizer ao outro que não deve trabalhar por x ou por y reais ou dólares. Mas alguns aspectos precisam ser relevados nessa discussão.

Vamos supor que o tradutor A cobre x centavos por palavra e o tradutor B cobre x + 3 centavos. Quem ganha mais? Depende. O tradutor A pode simplesmente digitar mais rápido e produzir um número de palavras suficiente para lhe garantir um rendimento maior. Ou talvez ele seja desleixado e não pesquise o suficiente, preferindo simplesmente adotar a primeira solução que lhe vem à cabeça. Por outro lado, ele pode ser melhor tradutor ou receber trabalhos que consegue fazer bem e com facilidade, sem precisar parar a toda hora para consultar o dicionário. Cada caso é um caso.

Outro ponto que deve ser levantado diz respeito a criticar quem trabalha por pouco. Cuidado, pois é fácil cometer injustiças. Há quem trabalhe por pouco por desconhecimento do mercado, por não saber que há quem pague bem por traduções bem feitas e que a qualidade do seu trabalho poderia ser mais bem remunerada. Há quem tenha medo de aumentar seus preços e ver seus clientes irem atrás de quem cobre menos. Na minha opinião, dois tipos de tradutores merecem crítica. Um é o que traduz de graça, por diletantismo e de forma pouco profissional, se esquecendo de que muitos traduzem para garantir o pão de cada dia. O outro é o que faz dumping, ou seja, cobra pouco para derrubar os concorrentes. Este presta um desserviço à profissão e não nos ajuda em nada.

Mas então o que fazer para que todos os tradutores recebam uma remuneração justa? Vamos tabelar! Nem pensar. Isso dá bode ao sul e ao norte do Equador. Quem já foi a um congresso da ATA, a Associação Americana de Tradutores, sabe que esse assunto não se discute lá. Chegue numa rodinha e pergunte quando este ou aquele cobra. Você vai ficar falando sozinho. Aqui no Brasil, o Sintra, o Sindicato Nacional dos Tradutores, é polo passivo numa ação iniciada pela Secretaria de Direito Econômico por causa da sua “lista de valores de referência praticados”. Ou seja, lá ou cá, estabelecer preços não dá certo.

O caminho é buscar sempre aumentar seus preços e procurar trabalhar com clientes que pagam mais. Isso me remete a um artigo que li recentemente que falava em price makers e price takers, ou seja quem dita e quem aceita os preços. Segundo a autora, você tem que ditar os preços. Claro, isso é muito mais fácil na teoria do que na prática. Se você está numa situação financeira confortável, tem outras fontes de renda, seu cônjuge ganha bem, é mais fácil fazer finca-pé e exigir mais. Mas se esse não é o seu caso e, sobretudo, se você está começando na profissão, o mais provável é que o mercado, ou seja, os clientes ditem os preços.

Que tal um exemplo da vida real? Na semana passada, mantive contato com um possível cliente que me ofereceu um pagamento que provavelmente não chegaria a um quinto do que meus melhores clientes me pagariam. Como você reagiria? Nada de espinafrar o cliente. Não sabemos o dia de amanhã. Na época das vacas magras, talvez esse cliente possa me salvar. Ainda não discuti preços com ele, mas vou chegar lá, vou mostrar meu pedigree e tentar aumentar o valor por palavra. Se não conseguir, nada de ser descortês. A melhor resposta que posso dar a eles é simplesmente ir trabalhar para outro cliente que pague mais.

Para encerrar, se você consegue cobrar alto dos seus clientes, regozije-se, mas não critique o outro que ganha menos. Em vez de perdermos tempo criticando, devemos buscar aumentar nossos preços, o que ajudará a melhorar a qualidade do mercado como um todo e ajudará os demais tradutores. Se você acha que está ganhando pouco, se aperfeiçoe e busque clientes melhores. No imenso mercado de tradução, ainda há quem procure qualidade e não apenas o menor preço. E não se esqueça: a mixaria para você é o feijão com arroz na mesa do outro. Sejamos humildes e trabalhemos para melhorar as condições para todos.

terça-feira, 10 de agosto de 2010

A nova Seleção

E estreia a nova Seleção, do Mano Menezes. Dizem as más línguas que os cariocas, para manter os costumes locais, estão chamando o novo técnico de Mermão Menezes. Mano ou Mermão, deu gosto ver o time com que ele vai sair para a partida. Ramires e Paulo Henrique Ganso na meia-cancha, municiando três atacantes: Neymar, Pato, Robinho. Que maravilha! É um começo promissor. Contudo, infelizmente algumas coisas não mudaram.

Entra ano, sai ano, sai um técnico, vem outro, mas nós torcedores brasileiros, os principais interessados na Seleção, continuamos sem poder acompanhar os seus craques de perto. Por uma série de razões, como restrições impostas pelas equipes europeias ao número de amistosos que seus jogadores podem disputar fora do continente por suas seleções e o fato de que a programação dos amistosos da Seleção está vendida para uma empresa “das Arábias”, praticamente só podemos ver o Brasil jogar ao vivo nas eliminatórias. Nos próximos quatro anos, em que não disputaremos o torneio porque vamos sediar o mundial, nem essa chance teremos.

O jeito é apelar para a TV. Mas o jogo de hoje à noite, a tão esperada estreia de Ganso e Neymar, jogadores que tantos quisemos ver com a amarelinha já na Copa da África do Sul, o povão não vai poder ver nem pela TV. A partida não será transmitida pela TV aberta, mas somente pelo SporTV, canal de TV por cabo. É uma pena. Terá sido decisão da Globo, para não atrapalhar a sagrada novela das oito, que agora começa as 21h? Tenha sido deste ou daquele, foi uma decisão lamentável. Sabe, não cheguei a ver as feras que defenderam a Amarelinha e ganharam os três primeiros mundiais pela Seleção, mas já sou velho o suficiente para me gabar de que sou da época em que a Seleção ainda jogava amistosos aqui no Brasil. Bons tempos aqueles.

A crise do português

Estou muito propenso a escrever no meu currículo que sou bom de crase e regência. A coisa está feia por aí. Todo o mundo erra nisso. Jornalistas, publicitários, secretárias, professores, advogados e, claro, tradutores estão escrevendo muito mal. Tradutor, mais especificamente, se esquece de que, antes de qualquer coisa, antes de ser usuário de CAT tools, ele é, por definição, um escritor. Infelizmente, o mercado impõe sua vontade cada vez mais. Tem de usar CAT tools. Escrever bem é secundário, é um detalhe, não faz tanta falta assim. Concordo que sem as ferramentas certas não dá, mas o texto e a sua qualidade estão ficando cada vez mais para escanteio. O problema é que, assim, o tradutor se aproxima cada vez mais da máquina. E, claro, a tradução de máquina é mais barata do que a humana. Quem traduz mal vai acabar ficando para trás e sendo purgado do mercado. Quer sobreviver e pegar trabalho bom? Vai aprender português.

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Criticar é fácil

É perfeitamente compreensível que os brasileiros que acompanham a Fórmula 1 e torçam por nossos pilotos estejam chateados com a cachorrada perpetrada ontem na Alemanha. Mas os tempos mudaram, o esporte não é mais aquele de Émerson, Piquet e Senna. A maioria está criticando o Felipe Massa injustamente, está empurrando um bêbado ladeira abaixo. Bater em quem não pode se defender é muito fácil. Nessas horas, algumas coisas passam despercebidas.

Não se pode criticar sem estar a par de tudo o que ocorre. Alguém já viu o contrato que a Ferrari firma com seus pilotos? Deve conter cláusulas estabelecendo que a equipe deva ser colocada em primeiro lugar. Imagino que, se o piloto não obedecer, corre o risco de pagar uma multa polpuda e até de perder o emprego. Deve ser fácil conseguir outro posto numa equipe de ponta da F1. Há tantas, não é? E são tão poucos pilotos. Dirigir um carro daqueles é um privilégio e o piloto se vê obrigado a aceitar muita coisa para fazê-lo.

Cria-se uma situação desconfortável, claro. O piloto quer ganhar a corrida, mas tem de respeitar o contrato que assinou, ou seja, tem que engolir esses sapos. Quem nunca teve vontade de ir lá e dizer umas poucas e boas para o chefe? Fácil, não é? Mas o teu emprego, o dinheirinho que você leva para casa no fim do mês, é mais importante. Você pensa bem, engole em seco, e baixa a crista. Isso também ocorre em casa, nos relacionamentos, amorosos ou não. Faz parte da vida. Mas sempre aparecem os inconsequentes para criticar a falta de coragem. É o que estamos vendo.

O grande problema é que nós torcedores nos iludimos achando que as corridas são decididas tão somente no braço de cada piloto. Há dinheiro e interesses demais envolvidos. As críticas deveriam ser dirigidas à Ferrari e a quem organiza o esporte, que permite essas cachorradas e não faz as regras serem cumpridas. Se não é para ter jogo de equipe, que não haja. A solução para a vergonha de ontem deveria ter sido a pronta desclassificação da Ferrari, o que puniria indevidamente o Massa, mas antes assim. Que se dê o exemplo para que não ocorra de novo. Mas não vai ser o caso. O todo-poderoso da FIA é o francês Jean Todt, ex-dirigente da Ferrari. Vai acabar em pizza... à italiana.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Emprego a dar com pau

Estava eu aqui pensando com os meus botões: se o governo conseguir iniciar e tocar todas as obras previstas para a Copa e as Olimpíadas, não vai haver peão que chegue. Vão pegar gente em tudo que é lugar para trabalhar nas obras. Se bobear, vamos precisar importar peão do mundo inteiro. Se você está desempregado, faça um curso de pedreiro, de mestre de obras, e fique de olho nos classificados. Emprego é que não vai faltar. Enquanto isso, vou me preparando para ver a Copa na Inglaterra, o plano B da FIFA.

Ideia de jerico

Autoridades paulistanas querem cadastrar os flanelinhas e guardadores de carro da cidade. É a mais completa ideia de jerico. Querem dar caráter oficial a uma atividade ilegal que nada mais é do que uma transferência de renda sob coação, uma extorsão. , ou seja, um crime. Por que, ao estacionar em área pública, tenho que dar dinheiro a um sujeito que está na rua dizendo que vai “tomar de conta” do meu carro? Ele vai se responsabilizar legalmente e financeiramente se ocorrer algo com o carro? Não vai. Isso não é coisa de país civilizado. Vai um sujeito ficar na rua cobrando para as pessoas poderem estacionar lá nos EUA, por exemplo. Vai preso por vagabundagem.

Na verdade, existe lei federal, de 1975, que prevê a profissão do flanelinha, vejam só. São os “guardadores e lavadores autônomos de veículos automotores”. Após registro e o cumprimento de algumas exigências, o sujeito pode exercer a profissão. Tem mais: o pagamento pelo serviço é opcional e o flanelinha é responsável pelo carro e pelos objetos nele deixados. Uma coisa dessas só funciona na cabeça dos nossos legisladores. É o que mencionei no artigo das sacolas. Criam-se leis estapafúrdias que, na prática, são difíceis ou impossíveis de serem cumpridas. Quem vai fiscalizar o cumprimento dessa e de outras leis? Ah, Brasil!

A lei das sacolas plásticas

É ponto pacífico que as sacolas plásticas, quando descartadas sem qualquer cuidado, provocam danos ao meio ambiente. Qualquer iniciativa para conter esse problema é bem-vinda, mas tenho minhas dúvidas quanto à lei que passou a valer no Rio na semana passada. Para mim, ela cria obrigações demais, será de difícil cumprimento e vai ser mais uma das tantas leis que não vai pegar. Será mais uma prova de que nós brasileiros pegamos uma boa ideia de fora, mas metemos os pés pelas mãos na hora de colocá-la em prática.

Fundamentalmente, a nova lei obriga os comerciantes do estado do Rio a deixarem de oferecer sacolas plásticas. A pergunta que vem logo à mente é: como os consumidores vão levar as compras para casa? O brasileiro até leva uma sacola, bolsa, carrinho quando vai à feira ou a uma quitanda, mas ainda não tem esse costume quando vai ao supermercado. É um habito que vai levar algum tempo para ser adotado, imagino. Eu, por exemplo, tenho duas bolsas no carro, mas quase nunca me lembro de levá-las para o supermercado quando vou fazer compras.

A lei tem detalhes que tornam seu cumprimento difícil. Caso o comerciante não se enquadre, está previsto que o consumidor que levar uma bolsa de casa tem direito a três centavos de desconto a cada cinco itens que comprar e que 50 sacolas, em qualquer estado, podem ser trocadas por um quilo de feijão ou arroz. Vai se criar a indústria da caça ao saco. Além disso, os comerciantes são obrigados a afixar placas educativas no seu estabelecimento explicando que as sacolinhas levam até 100 anos para se decomporem no meio ambiente. E claro, há uma multa, e como não, que vai de 200 reais a 20 mil reais para o comerciante que cumprir a lei. Confusão demais para o meu gosto.

Não acho que as sacolinhas, sobretudo as de supermercado, devam ser abolidas, pois já fazem parte da nossa cultura. Atire a primeira pedra quem não as usa para colocar naquele lixinho da cozinha ou no lixo do banheiro. Nos Estados Unidos, elas realmente se acumulam e ficam sem uso, pois normalmente o recipiente para o lixo é bem maior e vai no armário embaixo da pia. Concordo que trazemos bem mais sacolas do supermercado do que realmente precisamos, mas aí é só reciclá-las. Ou seja, o problema maior não é o uso que você faz das sacolas, mas sim como você se desfaz delas.

Outro ponto importante é que vão fiscalizar o cumprimento da lei. Brasileiro gosta desse negócio de fiscalização. É bem tupiniquim ser fiscalizado Precisamos ter alguém fungando no nosso cangote, olhando se não estamos fazendo alguma coisa errada, pois não sabemos andar na linha sem que alguém nos discipline. O pior é que certamente não haverá fiscais suficientes e logo esse ímpeto fiscalizador passa. Vai tudo voltar a ser como era antes e terão sido gastos recursos e energia à toa. Já vimos esse filme mais de uma vez.

Se eu fosse dono de supermercado, estaria furioso. A grande maioria das obrigações recai sobre quem vende. Vão ter que designar funcionário para receber as sacolas e contá-las, arranjar um lugar para guardá-las, educar os consumidores por meio das tais placas. A impressão que me dá é que fazem essas leis sem parar para pensar nas consequências na prática. Isso me lembra a lei recente que estabelece que as crianças até determinada idade devem andar no carro presas numa cadeirinha própria. Aprovaram a lei, mas não olharam antes se o mercado comportaria essa mudança. Foram forçados a suspendê-la.

Por que não seguiram o exemplo dos Estados Unidos? Em Washington, por exemplo, adotaram uma solução bem simples: cobrar cinco centavos por sacola. Claro, um bom tempo antes da imposição da cobrança, os supermercados passaram a oferecer bolsas reutilizáveis que o consumidor podia adquirir e, assim, fazer a sua parte. Criou-se uma única obrigação para o comerciante: contar quantas sacolas o consumidor levava para casa. E ainda se tem a vantagem de “fazer doer no bolso das pessoas”, o método mais fácil para forçar alguém a abandonar um mau hábito ou a adotar uma nova prática.

Infelizmente, mais uma vez começamos com o pé esquerdo. Agora é torcer para que, os demais estados ou o governo federal, caso este deseje fazer uma lei única para as sacolas plásticas, mirem o que foi feito no Rio e tentem fazer diferente. Claro, vai haver uma grita geral no começo (além de pagar pelas compras, tenho que pagar pelas sacolinhas?!), mas isso num instante se ajeita e o povo toma consciência do problema e adota a nova solução. É esperar para ver.

Um primor de texto

De perto ninguém é normal, já dizia Caetano. Tenho cá minhas esquisitices também. Uma delas é guardar jornal. Mas como assim? No fim do dia, não jogo o jornal fora se eu não o tiver lido. Guardo para ler quando puder. Na verdade, não leio o jornal exatamente por causa das notícias. Gosto dos comentários, das análises, dos editoriais. Ali está o melhor do jornal. Afinal de contas, nos dias de hoje é mais rápido receber as notícias pela Internet e pela TV. Mas com essa mania, às vezes se acumula uma pilha grande, da qual não me desfaço sem pelo menos dar uma passada de olho para ver se está indo embora algo importante. Sabe que vale a pena? Na terça-feira à noite, encontrei uma maravilha de crônica do João Ubaldo Ribeiro publicada no Estadão de domingo. Um primor de texto. Se eu simplesmente tivesse me desfeito do jornal, nunca teria lido aquela beleza. Bom, para quem ainda não leu, dê uma olhada aqui e se delicie.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Bairrismo

Vai um exemplo da rivalidade entre paulistas e cariocas? Concluída a nona rodada do Campeonato Brasileiro, Flamengo e Cruzeiro estão empatados em pontos, número de vitórias, saldo de gols e gols marcados. Se você olhar a tabela, por exemplo, no G1 (da Globo, carioca), o Flamengo aparece em quarto e o Cruzeiro em quinto. Já no caderno de esportes do Estadão, a chamada do artigo diz: "Fla bate lanterna e Cruzeiro chega ao G-4". Quem está certo? O G1. Se o campeonato acabasse hoje, o atual campeão brasileiro ficaria à frente e iria para a pré-Libertadores porque tem menos cartões vermelhos do que o time de Belo Horizonte. Mas, claro, o Estadão, um jornal de São Paulo, ignora os critérios de desempate e põe lá um time mineiro na frente do carioca. Encher a bola de um time do Rio é que eles não encheriam, naturalmente. Pequenez, ainda mais porque já é a segunda rodada seguida em que isso ocorre.

Nota: Acabei de notar que, na tabela, o Estadão colocou o Flamengo acima do Cruzeiro, embora empatados em quarto. Não está perfeito, mas dá pra passar.

sábado, 17 de julho de 2010

Tradução, apenas um serviço (1)

Na sexta-feira da semana passada, feriado de Nove de Julho aqui no estado de São Paulo, estivemos no Shopping Iguatemi. Passamos na Livraria Cultura e a Érica aproveitou para encomendar uns livros de que precisará para ministrar um curso neste semestre que se aproxima. A Cultura nos avisaria quando os livros chegassem para podermos apanhá-los (eu sei, eles também poderiam mandá-los para nossa casa, estamos cientes dessa opção, mas isso não vem ao caso). Aproveitamos a ocasião para comprar uns outros livros e já deixamos os da Érica pagos. Bastaria a ela trazer o comprovante para apanhá-los.

Na quarta-feira precisei ir ao Iguatemi para resolver outro assunto. Estava sem o referido comprovante, mas achei por bem dar um pulo na Cultura e ver se conseguia eu mesmo apanhar um dos livros, que já havia chegado. Fui à seção onde ficam os livros reservados e, para a minha surpresa, a funcionária me permitiu levar o livro. Bastou apenas me identificar e passar no caixa para desmagnetizar a etiqueta. Que maravilha! Mais uma vez eu ia à Cultura e saía de lá satisfeito. Para falar a verdade, não me lembro de uma vez sequer em que saí de uma loja deles tendo do que me queixar.

Mas por que estou contando essa história? Será que a Cultura está pagando um jabazinho ao João Vicente? E que raios isso tem a ver com tradução e com o título? Tem muito a ver. Estou iniciando com este texto uma série em que tento traçar paralelos entre a tradução e os mais diversos serviços prestados por aí. Já tenho mais dois ou três na manga e, certamente, outros virão. Afinal, na essência, a tradução guarda semelhanças com qualquer outro serviço. Nos parágrafos seguintes, quero me concentrar na satisfação do cliente.

Nosso mercado é disputado e a concorrência é grande. Para sobressair, não basta fazer a tradução direitinho e entregá-la no prazo combinado. Isso é o mínimo que se espera. É preciso ir mais longe, é preciso provocar no seu cliente sensação semelhante à que a Livraria Cultura me provocou. Da mesma forma que sempre volto à Cultura quando preciso de livros, o cliente satisfeito também voltará ao seu escritório, seja ele um cliente direto ou uma agência. Essa satisfação pode assumir diversas formas, mas destaco duas com base na minha experiência na quarta-feira.

Primeiro, a mais simples: a livraria resolveu o meu problema. Quando o cliente tem um problema, no nosso caso, a necessidade de ter um documento traduzido, o que ele mais quer é que lhe encontrem uma solução. Se for um problema sério, a solução vem para o primeiro plano e outros aspectos importantes, inclusive preço, podem até se tornar secundários. Segundo, a livraria resolveu meu problema de maneira fácil e rápida. Saí de lá naquele dia pensando “como é fácil trabalhar com esse pessoal”. Ora, quem não gosta de facilidade?! Cliente não quer aborrecimento, não se esqueça. No seu trabalho diário, almeje essa facilidade sempre, pois ela pode fazer a diferença na hora de perder ou manter um cliente. Até a próxima.

E a Copa se foi (não exatamente)

Junho e este início de julho foram meses bastante atribulados para mim. Quase uma semana depois da derradeira final, a maioria não quer mais saber da Copa, mas eu não poderia deixar de fazer meus comentários finais.

A Espanha mereceu ser campeã, embora não tenho jogado um futebol de primeira. É um time eficiente e deu para o gasto diante de uma seleção holandesa que entrou mais disposta a bater do que a jogar bola, lembrando a Holanda do primeiro tempo contra o Brasil. Durante todo o torneio, a Espanha não chegou a empolgar, mas não tomem isso como despeito ou choro de mau perdedor. Deixo essa distinção para o nosso presidente, que deveria ter ido à final da Copa, mas não o fez simplesmente porque o Brasil havia sido ejetado antes. Feio, descortês. Um chefe de Estado não faz isso.

No geral, não vou guardar lembranças boas desta Copa. Como positivo, destaco a escolha justíssima do uruguaio Forlán como melhor jogador do torneio, pois ele carregou o time nas costas durante todo o mundial. A grande decepção ficou por conta da Alemanha. Depois de apresentar um futebol de encher os olhos e golear Inglaterra e Argentina, os alemães se esqueceram de jogar contra a Espanha. Mas vai ficar mesmo na lembrança a má arbitragem. Não me lembro de uma Copa com tantos erros dos juízes e bandeiras. Que a FIFA tome uma providência e modernize o futebol.

Mas como indiquei no título, o assunto Copa não vai desaparecer. A Copa da África se foi, mas a Copa de 2014, a nossa Copa, vamos ouvir falar dela à exaustão até a bola efetivamente rolar. Infelizmente, até agora é só notícia ruim. Estamos com tudo atrasado, mas parece imperar a ideia de que “se os africanos conseguiram a gente também consegue”. Para ficar aqui na região, São Paulo, a maior, mais importante e mais rica cidade do país, ainda não sabe se terá o jogo de abertura. O Morumbi está descartado, o estádio que o Corínthians planeja construir é pequeno e, tudo conspira contra, o terreno onde querem construir o “Piritubão” está contaminado e, segundo a Cetesb, seriam necessários três anos para descontaminá-lo.

Diante das críticas da FIFA, Lula, o mau perdedor, o boquirroto do Planalto, sai com quatro pedras na mão e diz que não somos idiotas, que sabemos o que precisa ser feito e que tudo estará pronto. Idiotas somos nós, que já vimos esse filme e vamos assistir a uma continuação ainda pior. Os Jogos Pan-americanos tiveram o orçamento estourado em quase oito vezes, mas mesmo assim não aprendemos a lição. Claro, é bom lembrar que gastar mais que o orçado é comum a Copas e Olimpíadas, mas oito vezes me parece demais. Tudo que é feito a toque de caixa sai mais caro. Fiquemos de olho, pois estamos a caminho de fazer a Copa mais cara da história, provavelmente mais cara do que as que virão depois.

sábado, 3 de julho de 2010

Brasil x Holanda

E veio o que ninguém queria. Por melhor ou pior que esteja a Seleção, sempre temos ao menos um fiozinho de esperança de que dá para chegar e trazer o caneco mais uma vez. Diga lá que não dava para ter esperança, ao menos de chegar à semifinal, com um primeiro tempo daqueles? Como o futebol é caprichoso. Fizemos um gol com dez minutos, após um passe magistral de quem talvez menos se esperasse, do jogador mais criticado, que em pouco mais de uma hora de jogo, foi do céu ao inferno. Precisava cumprir as nossas expectativas, Felipe Melo? Saímos para o intervalo absolutos, tínhamos a partida nas mãos (ou nos pés, diriam alguns), mas conseguimos perdê-la, jogar fora o trabalho de quatro anos, por assim dizer. Foi uma tragédia em três atos.

Na minha crônica sobre o jogo contra o Chile, deixei de mencionar um dos meus maiores temores com relação à nossa equipe. Em nenhuma das quatro primeiras partidas, havíamos jogado com o placar adverso. Tomamos um gol dos coreanos e outro dos marfinenses, mas isso não fez muita diferença porque ambas as partidas estavam praticamente ganhas. Como jogaria aquele Brasil se saíssemos atrás no placar? Historicamente, nossa Seleção não sabe jogar muito bem com um placar adverso. Ora, normalmente somos nós que marcamos primeiro. Quando saímos em desvantagem, nosso sangue latino ferve e aí a coisa fica mais difícil. Ontem, não precisamos nem sair em desvantagem para perder a cabeça.

Bastou o gol de empate, aos oito minutos do segundo tempo, para solapar a tranquilidade e a confiança dos guerreiros do Dunga. Admita-se que não foi um gol qualquer. Na verdade, o gol contra do Felipe Melo foi, isto sim, uma falha clamorosa do Júlio César, considerado por muitos, inclusive por mim, o melhor goleiro do mundo. Errou feio quem menos esperávamos que errasse. Mas não era motivo de desespero. Havíamos controlado a partida até então. Havia tempo para desempatar, marcar até mais de um gol para afastar de vez a ameaça holandesa. Porém, consumou-se ali o primeiro ato da tragédia.

Um olhar mais aguçado revelaria que a Seleção que voltou para o segundo tempo não era a mesma do primeiro. Já na saída, colocamos a bola pela lateral. Abdicamos de jogar. Com a estrutura já abalada e os jogadores nervosos, a casa veio abaixo com o segundo gol, um gol que a defesa tida como a melhor do mundo não poderia ter tomado. Numa jogada mais do que manjada, cruza-se a bola no primeiro pau para alguém cabeceá-la para trás e facilitar a conclusão de quem estiver no miolo da área. Era o segundo ato. Mais uma vez tomamos um gol de um baixinho carequinha, à la Zidane em 98. Que o próximo técnico da Seleção fique de olho em adversários com esse perfil.

Daí em diante foi só esperar o fim do terceiro e último ato. Em inglês, diz-se que uma ópera não chega ao fim enquanto a gorda não cantar. E a gorda cantou na hora em que o Felipe Melo deu a botinada no Robben. Se já estava difícil com o time completo, imagina com um a menos. Talvez, tivéssemos empatado se o Kaká houvesse passado aquela bola para o Nilmar quando o ataque da Seleção desceu num dois contra dois, ou se o Daniel Alves tivesse cobrado bem a falta como o fez no ano passado contra a África do Sul. Mas teríamos condições de segurar a Holanda com um homem a mais na prorrogação? Só os deuses do futebol sabem, mas tenho minhas dúvidas. Mas será que foi só isso? Duas infelicidades da melhor defesa do mundo e uma atitude desclassificante de um jogador puseram tudo a perder e adiaram o sonho do hexa? Não.

x – x – x

Em inglês (de novo!), diz-se que hindsight is 20/20. A ideia é que, depois do acontecido, de posse dos fatos, é muito fácil falar, criticar. Infelizmente, isso não se aplica ao Dunga. Muitas das críticas feitas antes da Copa se concretizaram. Vou me deter em duas. Primeiro, a expectativa era que o Felipe Melo faria das dele em algum momento da Copa. Dunga não percebeu que o entrevero entre seu cabeça-de-área e o Pepe na partida contra Portugal era prenúncio de que algo pior estava por vir. Segundo, perdemos a Copa na convocação. Dunga não tinha um plano B. Na hora em que precisou, olhou para trás e viu um banco pobre, sem opções. Não teve como mudar o time. É esperar que o próximo técnico leve os melhores e não os mais obedientes.

Resta o consolo de que nuestros hermanos argentinos caíram de quatro e também ficaram pelo caminho. Até 2014.

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Brasil x Chile

Quase na hora do jogo com a Holanda e eu aqui ainda com a cabeça no jogo do Chile. Ando muito ocupado, com bastante trabalho, e o tempo está escasso. Parece que meu carma é ficar atolado durante a Copa do Mundo. Mas vamos ao jogo.

Diferentemente da maior parte dos cronistas esportivos, não fiquei satisfeito com o desempenho do Brasil. Junto-me ao Pelé, que afirmou que a Seleção ainda não o convenceu. Acho que o melhor jogo do Brasil foi contra a Costa do Marfim e ainda vejo o time carente em criatividade. Foram mais de 30 minutos até o gol, naquela cabeçada salvadora do Juan após o escanteio do Maicon. Até então, a Seleção pouco havia agredido o adversário.

Do lado positivo, achei que o Brasil estava mais leve, talvez pela entrada do Ramires, seguramente o destaque da partida. Ele fará falta no jogo contra a Holanda. Gostei também da zaga, que é o melhor que o Brasil tem oferecido até agora. Quem diria que chegaríamos a ver isso, numa seleção que, historicamente, sempre primou pela ofensividade e pela força de seu ataque? Os tempos estão mudando.

Apesar de não me convencer, acredito que a Seleção tem condições de passar pela Holanda. Não estamos jogando um futebol brilhante, mas já mostramos que será difícil marcar gols no Brasil e que temos poder de fogo para matar o jogo em um ou dois lances. Talvez ganhemos até a Copa com esse futebol competitivo, mas não é o que esperava ver. Sou fã do futebol bonito, bem jogado, e tá duro ver isso aí. Mas prometo tentar controlar minhas expectativas. Até a próxima.

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Erros de arbitragem

Não sei realmente o que fazer com os repetidos erros de arbitragem na Copa. Triste ironia a Inglaterra ver invalidado um gol legítimo, marcado num lance muito parecido com aquele da final da Copa de 66, também contra a Alemanha. Os deuses do futebol têm um senso de humor meio esquisito. Tomaram com uma mão o que se havia dado com outra. Um chip na bola, como sugerem muitos, teria resolvido esse problema, mas não adiantaria nada no impedimento do Tevez contra o México nem na levada da bola com o braço pelo Luís Fabiano. Parar o jogo e analisar o lance na tela, como fazem na NBA, por exemplo, é uma boa ideia, mas teria que ser feito com a maior agilidade possível, para não sacrificar a dinâmica do jogo. Já imaginou interromper a toda hora para analisar cada lance duvidoso?

Em última análise, talvez o erro da arbitragem faça parte do charme do futebol. Que equipe ou seleção nunca foi beneficiada ou prejudicada por um erro do juiz ou do assistente? Lembram-se da estreia do Brasil no mundial de 78, na Argentina, quando o juiz anulou o gol de cabeça do Zico, alegando que havia apitado o fim do jogo enquanto a bola viajava após a cobrança de escanteio pelo Nelinho? O que dizer daquele gol legítimo da Espanha contra o Brasil na Copa de 86, aquela bola que bateu no travessão, caiu dentro do gol defendido pelo Carlos, mas que o juiz não viu? E a partida da Copa América contra a Argentina em que o Túlio levou a bola no braço e empatou o jogo em 2 x 2? Guardo com carinho aquela imagem do juizão, que, diante das veementes reclamações dos argentinos, apontava com as duas mãos para o próprio peito, indicando que o lance havia sido perfeitamente legal. Uma coisa é certa: erro do juiz contra o time dos outros é refresco.

Brasil x Portugal

Um caso grave de esquizofrenia. Descobrimos outra Seleção, bem diferente daquela que havia ganhado, e bem, da Costa do Marfim. Embora o resultado tenha sido o suficiente para sairmos em primeiro no grupo e evitarmos o outro lado da chave, que, ao menos na teoria, me parece bem mais difícil, foi uma jornada bem ruim para o Brasil e a decepção foi geral. Salvo Júlio César, Lúcio, talvez, ninguém jogou bem. Até o Juan, que elogiei no jogo passado, errou e quase mata o seu goleiro, que teve que entrar numa dividida com um avante português.

Mas o que fica mesmo dessa partida é que falta gente para criar oportunidades de gol. Todos viram que nos ressentimos da falta do Robinho, do Kaká e, quem diria, do Elano. De trás pra frente, Daniel Alves entrou bem nas duas partidas anteriores, mas me decepcionou saindo como titular. Ciscou muito, pra lá e pra cá, mas não fez nada de muito produtivo. Chegou a me fazer lembrar do Zinho na Copa de 94, que foi apelidado de enceradeira por girar e girar e girar. Bem ou mal, Elano dá mais consistência àquele meio-campo e deixa o seu golzinho. Fará falta contra o Chile.

Júlio Baptista foi uma negação. Fez número, só. Quem me acompanha no Twitter (jvdepaulo) viu que eu não conseguia esconder a minha raiva. Ele não se apresentou para jogar. Só na imaginação do Dunga, La Bestia, como J. Baptista era conhecido na Espanha, poderia carregar aquele meio-campo, armar o jogo do Brasil e municiar o ataque. Ficou patente que não temos opção. Ramires? Não, não chega aos pés do Kaká nem resolve o problema. Só nos resta torcer para que o Kaká esteja em forma e à disposição nos quatro jogos que faltam, pois ele é muito mais necessário do que temíamos.

Por fim, faltou Robinho, que sentiu uma contusão que ninguém sabe bem qual foi, um incômodo, segundo se informou. Estou convicto de que não sou o único que não aguenta mais essa seleção de monges enclausurados. Nada pode vazar, ninguém pode saber muito do cotidiano da equipe para não atrapalhar o trabalho rumo ao hexa. Mas voltando ao Robinho, não é que o Nilmar tenha jogado mal ou seja ruim. É um grande atacante, mas não consigo vê-lo chamando a responsabilidade para si e procurando armar o jogo, como Robinho procurou fazer contra a Coreia. O Róbson, com ou sem barba, é outro de quem vamos precisar muito se quisermos ir longe na Copa.

Se olharmos do outro lado da cerca, vemos motivo para preocupação, ainda que pequena. O Maradona mandou a campo sete reservas e, ainda assim, venceu a Grécia por 2 x 0. Há um porém: não acho que a seleção argentina tenha sido efetivamente testada até agora. Só pegou galinha morta. Nigéria, Coreia do Sul e Grécia não são grandes equipes. O México, ontem, foi o de sempre. Joga, joga, mas está fadado a perder sempre. Vejamos o que faz a Argentina contra a Alemanha. Aí sim poderemos ter realmente ideia do que pode fazer o time do Maradona e, claro, se teremos condições de fazer-lhes frente.

Mas acredito numa vitória contra o Chile logo mais. Não espero um adversário jogando aberto, pra frente. O Bielsa é “loco”, mas não é bobo. Certamente guarda na lembrança as duas sapecadas que levou nas eliminatórias, sobretudo a de Santiago. Como retornam Kaká e Robinho, confio num placar elástico, 4 x 1, para manter a tradição de goleadas nos chilenos em Copas.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Tem que começar na hora

Depois comento Brasil x Portugal, com a cabeça mais fria. O assunto agora é outro. Uma coisa que reparei desde terça-feira é que os jogos da última rodada da fase de grupos começaram rigorosamente na hora. Houve uma defasagem de, no máximo, um minuto entre as duas partidas do mesmo horário. Nesta rodada do grupo H, são menos de 5 segundos. Compara com a última rodada do Brasileirão, em que os quase rebaixados usam o expediente de só vir a campo cinco, dez minutos depois do início da rodada, na esperança de que os outros jogos terminem e eles ainda tenham um tempo para fazer o resultado necessário. É falta de profissionalismo e desrespeito com a torcida que está no estádio e em casa. Se recebessem uma multa alta, punitiva mesmo, não faziam essa presepada. O pior é que a CBF não está nem aí. É a cara do Brasil.

Brasil x Costa do Marfim

Falta meia hora para Brasil x Portugal e só agora escrevo minhas impressões sobre Brasil x Costa do Marfim. Perdoem a demora, mas andei muito ocupado com um trabalho grande.

Mas o que falar daquele jogo. O Brasil jogou bem melhor do que no primeiro jogo. Finalmente apareceu o verdadeiro futebol brasileiro. Destaques? Juan foi um monstro na zaga. Sempre preciso, um tempo de bola fantástico. É por isso que quase não se vê o Juan dar pontapé. O Lúcio também esteve bem, mas é aquele futebol meio atabalhoado. Quem anda acompanhando o noticiário, deve ter ouvido falar que o Felipão está trabalhando para uma TV sul-africana, comentando os jogos. Antes da partida, ele disse que, logo no primeiro lance, o Lúcio tentaria acertar o braço do Drogba. Não deu outra. Na primeira disputa com o marfinense, o Lúcio foi lá e deu-lhe um soco no braço, que acabou não fazendo muita diferença para o desfecho da partida.

Do meio para a frente, Felipe Melo tem surpreendido. Tem ocupado os espaços bem, marcado direitinho, sem muita violência, e passado bem a bola. Quem te viu, quem te vê. O Kaká também surpreendeu. Ainda não está voando, mas mudou da água para o vinho se compararmos com a bolinha que jogou contra a Coreia. Elano manteve a regularidade, guardou mais um golzinho, mas acabou sendo castigado por aquela falta desleal, que o deixou fora de combate para a partida seguinte. Robinho esteve meio sumido. O principal lance dele, para mim, foi negativo. Aquela bola que ele pegou logo no comecinho e chutou em gol, tentando encobrir o goleiro. O Luís Fabiano corria solta pela esquerda. Houvesse passado a bola para ele, Robinho teria tornado o jogo ainda mais fácil.

Mas falemos do astro da noite: o Fabuloso, que jogou com vontade. Aquele segundo gol, apesar de irregular, foi uma pintura. Valeu pela plástica do lance, pela iniciativa do atacante. Claro, no dos outros é refresco. Fosse a Argentina que houvesse marcado um daqueles em cima da gente, estaríamos bufando até agora. Felizmente, não foi por causa daquele gol que vencemos o jogo, como no Argentina 2 x 1 da Copa de 86, quando o Maradona fez aquele com a mão. Teríamos ganhado por 2 x 1 e, acredito eu, se a Costa do Marfim houvesse apertado, tínhamos caixa pra mais. E vale notar: o nosso "gol de mão" foi mais bonito do que o do Maradona. Na hora, cheguei até a me lembrar daquele gol do Pelé na Copa da Suécia, em que o Rei chapelou o zagueiro. Houve até quem dissesse que o Fabuloso condensou em um lance o que fizeram Pelé e Maradona.

Mas ridículo mesmo foi aquele juiz francês. Perguntar ao Luís Fabiano se ele havia usado o braço foi ridículo. Teria sido melhor se houvesse simplesmente ignorado o lance. Volto a bater naquela tecla: ainda bem que o gol foi nosso. Mas a França não fez só papelão apitando: foi embora mais cedo, como última no grupo, assim como a Itália. Interessante é que França e Itália fizeram a final da última Copa. Alguém ainda não se convenceu de que futebol não tem lógica.

Mas vamos ver como o Brasil se sai diante dos portugueses. Aposto num 2 x 1 ou 3 x 1 pra gente. Não me impressionam os sete gols disparados contra a Coreia. Adversário nas oitavas? Confiando que sairemos em primeiro no grupo, devemos pegar o Chile. Acho que a Espanha atropela o Chile e a Suíça empata com Honduras. Até mais!

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Brasil x Coreia do Norte

Ando meio afastado do blog porque estou com muito trabalho. Mas estou tentando me organizar e em breve volto a escrever aqui regularmente. Por ora, uma breve opinião sobre Brasil x Coreia do Norte.

Também acho que o Brasil jogou mal. Houve um momento na primeira etapa em que o time chegou a parar, dando a impressão de que não sabia o que fazer. Mas depois a coisa melhorou no segundo tempo. Quero atribuir muito disso ao nervosismo. Quem olhar o histórico recente das estreias brasileiras em Copa vai perceber que é sempre um jogo amarrado, difícil. Assim, não devemos nos deixar impressionar pelo placar.

Analisando friamente, sem paixões, nossos adversários devem estar pensando no seguinte: o passe do Robinho foi magistral e o gol do Maicon, como dizíamos na minha pelada, foi espírita. Ninguém na Copa fez um gol nem perto daquele. É esse talento que separa o Brasil da grande maioria das outras equipes. Fica a ideia de que, mesmo jogando mal, o Brasil tem jogadores talentosos que podem tirar dois coelhos daqueles da cartola e ganhar o jogo.

E para fechar, claro, faltou o Paulo Henrique Ganso ali para furar a retranca dos caras. Espero que o Dunga não venha a se arrepender de ter deixado o paraense fora do time. Aquele abraço!

terça-feira, 1 de junho de 2010

Chapa (adendo)

Depois de escrever o artigo anterior, recebi uma mensagem de uma estimada colega e amiga, me chamando a atenção para o fato de que os chapas têm uma função específica: ajudar os caminhoneiros, seja orientando-os no trânsito, seja cuidando da carga e descarga do caminhão.

Mas e agora, isso muda alguma coisa na minha tradução? Sim, muda. Se eu estivesse, como mencionei, passando pela estrada e um estrangeiro me perguntasse o que significava aquilo, diria a ele a mesma coisa que disse antes (He is a day laborer) e explicaria que aquela pessoa faz um serviço específico. He helps truck drivers navigate the streets of large cities and oftentimes helps with loading and unloading the truck. Esse esclarecimento seria necessário e útil, pois os day laborers que ficam postados nos estacionamentos do 7 Eleven lá nos EUA se ocupam de outras tarefas, sobretudo na construção e na jardinagem.

Mas será que os caminhoneiros de lá dos EUA não têm o seu chapa para ajudar no trânsito das grandes cidades? Têm, têm sim. Ele segue o tempo inteiro na boleia do caminhão e se chama GPS.

E aí, meu chapa

Ontem me lembrei de outra palavra que aprendi depois que me mudei para o estado de São Paulo. Há uns meses, dirigindo pela rodovia Dom Pedro I, vi num sinal bem tosco, de papelão, próximo ao acostamento. Nele se lia a palavra CHAPA. Curioso que sou, fiquei me perguntado que história de chapa era aquela, mas acabei me esquecendo dela antes de voltar para casa.

Uns dias depois, passei lá com a Érica e aí perguntei a ela do que se tratava. Descobri que chapa é simplesmente um trabalhador informal, que fica ali na beira da estrada esperando alguém que passe e lhe ofereça um serviço, normalmente um trabalho braçal. Não me lembro de ver isso em Brasília.

Para os tradutores, como é que a gente chamaria esse chapa em inglês? Se eu estivesse passando ali na hora com um estrangeiro e ele me perguntasse o que significava aquilo, eu lhe diria, “He’s a day laborer”, que é uma figura bastante comum nos EUA.

Mas é bom ter cuidado na hora de traduzir do inglês para o português. Primeiro, chapa é uma gíria, enquanto day laborer não é necessariamente parte do registro informal da língua inglesa. Antes, é uma expressão da norma padrão do inglês.

Segundo, day laborer é um conceito bem mais amplo. Pode se referir tanto aos trabalhadores informais e pouco especializados que se reúnem em esquinas ou no estacionamento de lojas de conveniência à espera de alguém que passe e lhes dê serviço (a ideia mais próxima do nosso chapa), como aos que trabalham por empreitada e conseguem serviços de curta duração, normalmente inferior a um dia, de agências de emprego ou sindicatos.

Terceiro, é bom ter em mente também que uma parcela significativa desses trabalhadores é formada por imigrantes ilegais. Por esse motivo, embora sirvam de mão-de-obra barata para uns, são alvo de preconceito de outros e chegam até a ser vistos como criminosos em potencial.

Para concluir, do português para o inglês, day laborer é uma boa tradução para chapa, mas essa equivalência não funciona no caminho inverso. Para quem ainda se lembra de matemática, não temos uma correspondência biunívoca. Trocando em miúdos, todo chapa é um day laborer, mas nem todo day laborer é um chapa. Como sempre, o contexto vai ditar a melhor opção.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Fiscalização eletrônica

Para começar esses papos sobre tradução, algo que todo o mundo conhece. No fim de semana passado, fomos a Campos do Jordão visitar uns amigos. Pela Dom Pedro e Carvalho Pinto, se lia nas placas: "Fiscalização Eletrônica". Mas como se diz isso em inglês?

Se você pensou em electronic fiscalization, já comeu bola. Para começar, fiscalization não tem esse sentido do qual estamos tratando no português, como já mencionei num artigo neste blog. Mas não se aflija. As opções são várias:

Nos EUA, normalmente se vê uma placa branca com o limite de velocidade (speed limit) e, abaixo, os dizeres photo enforced. Mas e se for no sinal (ou farol, como dizem aqui em São Paulo)? Red light e, logo abaixo, photo enforced é bem comum, assim como o desenho clássico do sinal, com as três luzes coloridas, e photo enforced abaixo.

Outras expressões úteis nesse contexto são red light camera, speed camera, electronic speed tickets, e-tickets. Existe até um site, www.photoenforced.com, em que você pode verificar onde estão localizados os “pardais” nas ruas e estradas dos EUA. Evidentemente, a melhor opção no seu texto vai depender, como tudo na tradução, do contexto.

Mais tradução

Há tempos venho pensando em passar a escrever mais sobre tradução neste espaço. A partir de hoje, começo a pôr essa ideia em prática. Mas não esperem ensaios sobre teoria da tradução. Teoria não é a minha; gosto da prática. O que pretendo fazer é mais ou menos na linha do “mas como é que a gente traduziria isso?” Vou pegar coisas que encontro no dia a dia, seja na rua, no jornal, na Internet. Não fiz opção por esta ou aquela língua de partida. Também vou aproveitar para lançar um olhar crítico sobre o que se escreve por aí e mostrar que a coisa está cada vez mais feia.

É bom frisar que as sugestões de tradução a serem apresentadas são exatamente isso: sugestões, pois, com muito mais frequência do que imagina o leigo, há mais de uma forma de traduzir uma palavra, expressão, frase. Minhas traduções vão se basear na minha experiência, sobretudo com o inglês americano e os Estados Unidos, e podem diferir da sua tradução. Assim, acolherei críticas, sugestões, comentários, especialmente aqueles com soluções que funcionariam em outros países. O espaço é livre.

Por fim, antes que perguntem, os textos pessoais vão continuar, entremeados com os artigos sobre tradução. Ainda não vejo a necessidade de separar as duas coisas. Aquele abraço.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

A língua nossa de cada dia

Após ter passado praticamente a vida inteira em Brasília, minha cidade natal, e os últimos oito anos nos EUA, vim morar no interior de São Paulo, a mais ou menos uma hora da capital. Nesses quatro meses que estou aqui, tenho, como sempre, prestado muita atenção no que leio e escuto. Algumas coisas têm chamado a minha atenção, umas positivas, outras nem tanto.

Logo que chegamos, mais precisamente quando a Érica começou a dar aula, descobrimos com os alunos dela que uma coisa que sempre gostei de fazer tem nome. Desde pequeno, sempre tive o costume de molhar o pão ou a torrada ou o biscoito no café com leite. Aqui na região de Campinas, chamam isso de pochar. Conheciam? Serve também quando se molha o pão na sopa, no chá, etc. Entrou, claro, para o meu vocabulário.

Outra coisa que me chama a atenção aqui é o costume das pessoas de chamar as outras apenas pela primeira sílaba do nome. Não me lembro de fazermos isso em Brasília. Aqui é muito usual. Na escola, as crianças são chamadas de Rô e Clá. Pode?! E pensa que eles gostam? Já os instruí a responder que é Rodrigo e Clarissa. Mas para ter uma ideia de como é sério isso aqui, uma frase como esta seria perfeitamente compreensível na família da minha mulher, de São José do Rio Preto: “Pá, fala pra mã que a Dá, a Mi, o Fá e a Mê vão passar o fim de semana na casa da Vã e do Ju. Será que é costume só aqui em São Paulo ou isso é usual em outras partes do Brasil?

Mas tenho visto uma também que, vamos ser sinceros, é bem feia e, por mim, deveria sumir. Que história é essa de “chupa”? Quando o Flamengo eliminou o Corínthians na Libertadores, recebi um email de um amigo são-paulino com os dizeres “Chupa timinho”. No Twitter foi um tal de “Chupa Flamengo” após a eliminação da Libertadores. Mas não é só com time de futebol. No Twitter mesmo se lê Chupa PT, Chupa Garotinho, Chupa Dilma. Quando saí do Brasil no comecinho de 2002, eu não ouvia isso. De onde veio essa besteira? Tá bom de ela voltar pra lá e não aparecer mais.

terça-feira, 18 de maio de 2010

Caro carro, carro caro (2)

A título de comparação, hoje deu no G1 que a Chevrolet vai lançar o sedã Malibu aqui no Brasil (http://tinyurl.com/38pljsx). O Malibu é um carrinho normal nos Estados Unidos, não é considerado um carro luxuoso. Lá, custa a partir de 22 mil dólares (http://tinyurl.com/29q637j). Aqui, vai custar a partir de 90 mil reais e, vejam só, vai ficar posicionado entre o Vectra e o Ômega. Mais um básico americano vendido aqui como carro de luxo e por um preço exorbitante.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Caro carro, carro caro

No fim de semana, li reportagem da revista Exame sobre o porquê dos automóveis serem tão caros no Brasil, tanto em termos absolutos como em comparação a outros países emergentes como o nosso. Para mim, dois pontos se destacaram, um evidente e outro que talvez não venha de imediato à ideia.

O primeiro é que uma boa parcela do preço dos carros é imposto. O governo arrecada muito e, claro, não vai abrir mão dessa fonte de receita só porque o povão quer carro mais barato. O segundo e, para mim, o pior, é que, apesar dos preços altos e das condições de crédito escorchantes, nunca se vendeu tanto carro no Brasil. Se vende tanto, por que as montadoras e revendedoras baixariam os preços? Ora, se a demanda pela minha mercadoria é grande, posso subir meu preço ou, ao menos, mantê-lo lá em cima.

Em suma, se alguém tinha alguma esperança de um dia não ter que gastar uma fortuna na hora de comprar um carro, pode ir tirando o cavalinho da chuva porque isso não vai ocorrer tão cedo. Assim como em tantos outros casos, continuaremos a pagar caro por um bem de qualidade inferior à que se consegue, por bem menos, em outros países.

sábado, 15 de maio de 2010

Chutes e pontapés

"Quando vamos subir no palco, o espírito é sempre esse: vamos chutar uns traseiros!" (Frase extraída da entrevista com Tom Hamilton, baixista do Aerosmith, publicada no caderno C2+música do Estadão de hoje e também no site do jornal (http://tinyurl.com/3687fqf).

Você aí que me lê, mas não fala inglês, deixa eu fazer uma pergunta: Entendeu o que esse cara quer dizer com essa história de subir ao palco e aplicar pontapés na bunda dos outros? Que história amalucada, hein? Faz sentido pra você?

Claro que não faz sentido. Na verdade, quem merece uns chutes é a anta do tradutor. Num contexto como esse, quando o sujeito diz que vai kick some ass, está simplesmente dizendo que vai botar pra quebrar ou, caso você prefira usar uma palavra chula como no inglês (ass não é palavra que se diga na frente da avó), botar pra foder (ou fuder, como preferem alguns).

Essa história me fez recordar de outro erro no mesmo estilo. Uma vez li que a Madonna havia dito que uma determinada música lhe havia arrancado as meias (had knocked her socks off). Música arrancando meia é brabo, hein?! A música havia simplesmente arrebatado a Madonna, lhe agradado em cheio, só isso.

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Back in the saddle

After eight years as a staff translator at the IMF, my employment relationship with the Fund finally came to an end yesterday. This means I am now free to take any job or work that comes my way. I have set up shop in the São Paulo area and, for the time being, will be pursuing a freelance translator career.

Although I started out as a freelancer, working in-house for eight years makes it fell like I’m starting afresh on a completely new job. It’s not quite like that, but it’s still an exciting challenge.

So, JV is now open for business. Bring it on!

x - x - x

Após oito anos trabalhando como tradutor concursado no FMI, meu vínculo empregatício com o Fundo foi finalmente encerrado ontem. Isso significa que agora estou livre para aceitar o trabalho ou emprego que bem entender. Por ora, vou trabalhar como tradutor freelance na região de São Paulo.

Embora tenha começado como freelance, após trabalhar oito anos fora desse mercado, tenho a sensação de que estou começando num emprego totalmente novo. Claro, não é exatamente por aí, mas ainda assim tem um gostinho de desafio.

Portanto, estou de volta ao mercado e aberto a projetos e parcerias. Vamos em frente.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

A conta de luz e o frio

Na sexta-feira chegou a conta de luz. Duzentos e cinquenta e sete reais e uns quebrados! Se considerarmos que a casa em que moramos não tem calefação nem ar condicionado, uma conta dessas é uma fortuna, um disparate. Fico maluco quando penso que tenho que pagar tudo isso e, mesmo assim, passar calor no verão e frio no inverno. Gasta-se um montão e não se tem conforto, o que se aplica a vários aspectos da vida no Brasil. Nos EUA, pagava proporcionalmente menos pela energia, pois morava numa casa talvez um terço maior do que esta, com sistema de ar condicionado e aquecimento central. Mas é que somos roubados, sobretudo pelo governo. Nessa conta, só de ICMS, estão me tomando quase 65 reais.

x-x-x

Hoje amanheceu frio aqui em Vinhedo. Às 7h, fazia uns 13°. Meus amigos americanos certamente vão dizer que 13° não é frio. É, não é exatamente frio. Mas se você tem que ficar numa casa sem aquecimento, sentado à frente de um computador, batucando no teclado, aquele friozinho vai aborrecendo, vai fustigando o cristão. Encheu tanto o saco que fui calçar meias e mantive a calça jeans que pus para ir comprar o meu jornal e uma rúcula para o almoço. Olha, dá para dizer até que se sofre mais com o frio aqui do que lá onde morávamos. Mas lá fazia temperatura abaixo de zero, nevava, diriam os mais friorentos. Sim, mas dentro de casa era quentinho. Aqui, você não tem para onde correr. O jeito é se agasalhar todo, o que me desagrada. Casaco dentro de casa não dá.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Coisas que te deixam com os olhos marejados

Promessa é dívida: A tradução (livre, bem livre) do texto em inglês do dia 28 de abril.

"Acabei de receber uma mensagem da ex-professora da Clarissa do primeiro ano, lá da escola da Virgínia. Ela juntou recados enviados à Clarissa por alguns dos ex-coleguinhas. É o tipo de coisa que te deixa com os olhos marejados.

'Querida Clarissa,

A turma sente muita saudade de você! Temos umas coisinhas pra te dizer:

Espero que esteja curtindo aí no Brasil e torço para que se divirta bastante. (Caroline)

Espero que esteja se divertindo aí no Brasil. Você ainda tem aquele peixinho? (Natalie)

No Dia da Terra, demos um pulo fora da escola com os nossos colegas do quinto ano. Encontramos um monte de lixo e ajudamos a Terra. Você ainda está no meu coração e sinto muita saudade de você. Queria muito que você tentasse arrumar um voo para voltar com a sua família e vir à escola nos visitar. Queria que ficasse aqui pra sempre. Tenho certeza de que todos gostariam de te rever. (Kinsley)

Sinto tanta saudade de você! Estamos no quarto livro da Mrs. Piggle-Wiggle (Mitchell)

Espero que esteja curtindo bastante a sua nova escola. (McKenzie)

Quando estávamos catando lixo, encontramos uma canoa, mas não a jogamos fora; seria grande demais. (Christopher)

Sentimos muita saudade de você e torcemos para que volte. (Kate)

Clarissa, sentimos muita saudade de você. Esperamos que esteja se divertindo com sua família. Tem um menino novo, chamado Taylor, na nossa sala. Espero que esteja curtindo o Brasil. Adoramos quando você estava aqui conosco e ficamos tristes porque foi embora, mas ainda guardamos você no coração. Adoro você como amiga. Estamos muito felizes que você está se divertindo aí na sua nova casa. Sentimos muita saudade. Gostei pra valer de brincar com você e ainda guardo você no meu coração. (Brennan)

Espero que esteja gostando da sua nova casa. (Emily)

O tempo aí no Brasil é frio ou quente? Acho que deve ser quente porque fica perto do Equador. (Taylor)

Espero que esteja se divertindo aí no Brasil. (Eli)

Tem Dia da Terra aí no Brasil (Daniel B)

Espero que ainda esteja se divertindo aí no Brasil (Daniel F)'

O engraçado foi que, ontem à noite, a Clarissa pediu para dar uma olhada no scrapbook que deram para ela um dia antes de partirmos. Olhou detidamente cada página e, hoje de manhã, pediu para levá-lo para a escola, para mostrá-lo aos coleguinhas. Pra mim, foi uma coincidência assustadora.

Vou imprimir a mensagem da professora e deixá-la na cama da Clarissa. Vai ser uma tarde de fortes emoções."
 
Até que ela reagiu bem. Ficou felicíssima ao ler os recados. Os olhinhos brilhavam, mas não houve drama nem chororô porque queria voltar pra lá. Isso é bom.

Bem que eu queria ir

É, bem que eu queria ir ao Pacaembu logo mais, dar uma força para o meu Mengão, mas não vou. E não é porque não consegui ingresso. Na verdade, nem procurei. Achei melhor ficar em casa e ver pela TV. Afinal de contas, não é de hoje que ir a um estádio de futebol no Brasil é quase sempre um programa de índio com selo de qualidade Funai.

No comecinho de fevereiro, menos de duas semanas após voltarmos para o Brasil, estávamos hospedados na casa de uma prima da Érica, perto de Campinas. O marido da prima, corinthiano, me chamou para irmos ver o Timão enfrentar a Ponte Preta lá no Moisés Lucarelli, o Majestoso (que devia ser majestoso quando foi inaugurado; agora está de dar pena). Fomos, mas que situação. Saímos de casa como se estivéssemos indo para a guerra. As mulheres nos cobriram de recomendações e pediram que tomássemos cuidado e não sei mais o quê. Ficaram em casa preocupadas. Pode?

Eu fico me lembrando de quando ia a praças de esportes lá nos EUA. Nem passava pela cabeça da Érica que eu poderia correr algum risco lá no jogo. Corria tudo na maior tranquilidade, na maior civilidade. Não havia esse negócio de uma torcida entrar por um lado e outra por outro; nada de um torcedor intimidar o outro, dar “pescotapa”, jogar xixi. Isso é coisa de bicho. Cada um torce para o time que bem entender, ora!

Mas voltando ao clássico Macaca x Timão, que experiência! No campo, o jogo até que foi bom, bem movimentado, disputado. Mas o resto foi triste. Na chegada, você já fica preocupado com o carro. Onde estacionar? Por que dar 10 reais para um vagabundo que diz que vai “tomar de conta”, mas vai embora para casa aos 5 minutos do primeiro tempo? Será que o carro vai estar lá quando voltarmos? Mas o negócio é entregar a Deus e torcer para que nada ocorra.

Lá dentro, a coisa piorou. Acabei no meio da torcida do Corínthians, entre a Camisa 12 e a Pavilhão 9. Já imaginaram que beleza? E ai de você se der pinta de que não torce para o time deles. Você fica lá tenso, acompanhando o jogo, mas sem deixar transparecer que está ali apenas para apreciar a partida. Para salvar a minha pele, eu reclamava de um ou outro jogador, xingava o juiz. Apanhar é que eu não iria, ora! É uma pena que seja esse o clima em grande parte das arquibancadas dos estádios brasileiros. Ou você se enquadra e segue o que o chefe mandar, ou então corre sério risco de não sair dali inteiro.

Mas o pior ainda estava por vir. Em dado momento, uma das organizadas quis esticar a sua faixa ali na frente e também mostrar que estava ali seguindo o seu time. Outra, que já estava com a sua faixa colocada desde o primeiro tempo, se melindrou e não quis afastar a sua faixa para dar espaço para a da outra. Começaram a se olhar feio, e eu pensando, “Não, esses animais não me vão brigar aqui por causa de uma porcaria de uma faixa”. E enquanto isso, a polícia só olhava e o Finazzi, ex-jogador corinthiano, virava o jogo para a Ponte. Pronto, aquele gol tinha tudo para desencadear um quebra-pau generalizado. Era o programa de índio se tornando cada vez mais real.

Mas tudo acabou bem. Fomos embora rapidinho tão logo o juiz apitou o fim da partida, encontramos o carro onde o havíamos deixado e chegamos em casa sãos e salvos, para o alívio das esposas. Mas peraí? Isso é lá diversão? Duas, três horas de tensão apenas porque saímos de casa para ver um jogo? Já está mais do que na hora de as autoridades apertarem essa turma barra pesada travestida de torcedor, afugentá-los dos estádios e tornar um jogo de futebol um programa família, como o é qualquer evento esportivo nos Estados Unidos. Um dia chegamos lá.